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BandaLarga

as autoestradas da informação

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Urbano Tavares Rodrigues - Prof Raúl Iturra

 

Tive a sorte de conhece-lo na tarde da sua vida. Ele e eu somos portugueses. Ele e eu tínhamos estado na cadeia por causas políticas. Ele e eu falávamos de literatura, queríamos esquecer os piores momentos da vida, de cadeia, campo de concentração e exílio. Eu morava em Cambridge quando soube que Allende corria para a Presidência da República do Chile. Faltaram-me pés para voar e votar por ele. O que o meu escritor aplaudia. Advertiu-me para ter cuidado, a vida jogava más passadas quando tratava-se de política. Ele e eu éramos filhos de latifundiários, com uma diferença: ele acreditava que a terra era para quem a trabalhava e foi assim que a entregou para os jornaleiros da sua terra. Não tive essa sorte: fui expulso da família bem antes da presidência de Allende, por ser um revolucionário que formava sindicatos rurais. Ele foi expulso do país, como eu o seria mais tarde, por causa de defender os direitos do proletariado. Esteve preso em Caxias, mesmo sítio em que o meu amigo editor de Viagem dos Argonautas, tinha também estado. E Álvaro Cunhal. E tantos outros por clamar pelo direito a igualdade, a vida libertária e com trabalho. Todos nós tivemos que andar de país em país em procura de asilo e de apoio para a nossa subsistência.

Mais sobre a sua vida, em: http://www.jornaldenegocios.pt/economia/cultura/detalhe/urbano_tavares_rodrigues_faleceu_esta_sexta_feira.html ou na Wikipédia, que diz logo ao começo: Filho do escritor Urbano Rodrigues, nasceu em Lisboa e passou a infância em Moura. Criado numa família de grandes proprietários agrícolas, recebeu as influências das gentes do campo, o que marcou indelevelmente a sua obra escrita. Frequentou a Faculdade de Letras de Lisboa, onde se licenciou em Filologia Românica. Impedido de lecionar em Portugal, foi leitor de português nas universidades de Montpellier, Aix e Paris, entre os anos de 1949 e 1955. Depois do 25 de Abril de 1974 regressou a Portugal. Em 1984 doutorou-se em Literatura, com uma tese sobre a obra de Manuel Teixeira Gomes. Em 1993 jubila-se como professor catedrático da Faculdade de Letras. Foi igualmente professor na Universidade Autónoma de Lisboa Luís de Camões. Foi membro efetivo da Academia de Ciências de Lisboa e membro correspondente da Academia Brasileira de Letras. Em http://pt.wikipedia.org/wiki/Urbano_Tavares_Rodrigues#Vida_e_obra

Quem quera saber mais, pode ler e enciclopédia citada.

Apenas sei que me dissera um dia: a vida do escritor é de uma permanente disciplina: todos os dias um pouco, traçar a linha da trama e escorregar-se por essa trama ao longo de vários dias, com calma, sem presas e com muita pesquisa prévia.

Foi comunista desde a sua juventude, mas abandono, como os meus amigos da alma Maurice Godelier em Paris e Jack Goody, em Cambridge, quando a então denominada União Soviética invidiou a Hungria, país socialista e livre. O PC perdeu os seus melhores adeptos. Entre eles, Tavares Rodrigues.

Sobre a sua vida e a sua obra, há os meus colegas de escrita que o analisam melhor. Estas palavras são apenas uma homenagem para um escritor de ideologia comunista, mas pouco ortodoxo, por ter sido influenciado pelos existencialistas da França, como Simone de Bouvier1 e o seu companheiro Jean Paul Sartre2. Essa ternativa para um marxismo em liberdade. Como a homenagem que redigi para o meu Presidente Allende no blogue a Viagem dos Argonautas3, orientada por Carlos Loures.

Urbano Tavares era filho de escritores e pai de escritores, companheiro de luta de Jerónimo de Sousa e antes, de Álvaro Cunhal.

Catedrático e doutor em Letras na Universidade de Lisboa e na Universidade Aberta Luís de Camões, falávamos sempre desse prazer do ensino, essa procura da filologia românica e os seus integrantes, o povo.

Os meus sentimentos vão para a família, para os seus colegas de partido e ideologia e para seus dotes de escritor da resistência desde a sua prisão en Caxias em 1960.

Um se não nos separa: ele é comunista ortodoxo, eu sou socialista materialista histórico, como Allende, não como Sócrates, Seguro e Mário Soares. Mas não lembramos essas diferenças por estarmos a memorizar esse bom fadado encontro na SPAE e as suas conversas, verdadeiras aulas de como escrever melhor.

A minha homenagem a Urbano Tavares é este texto e os dois depoimentos escritos ontem no facebok e por baixo da notícia da sua defunção. Meus colegas portugueses são capazes de analisar a sua obra. Enquanto é velado na SPAE, escrevo estas palavras: uma doença curável não me permite assistir, como queria, a seu funeral.

As minhas sinceras palavras de agradecimento, por me ensinar a escrever e ser tolerante, até o ponto de perdoar a Mário Soares ter mandado mudar a Constituição Portuguesa de uma passagem para o socialismo, para a definir como hoje no artigo 2: Estado de Direito Democrático…apenas, com os troikistas a governar!

Descansa Urbano Tavares Rodrigues. A sua obre será editada todo este ano.

Raúl Iturra

Etnopsicologo da Infância

Escritor

lautaro@netcabo.pt

10 de Agosto de 2013