Como é que a economia pode crescer e o desemprego diminuir se não há investimento ? Não pode e mais tarde ou mais cedo Mário Centeno vai pagar a factura .
O ‘mistério da retoma sem investimento’ que tem caracterizado a economia portuguesa nos últimos anos e que se deve ao facto da muito forte criação de emprego (uma excelente notícia) ter estado nos últimos anos muito concentrada em sectores de baixa produtividade, fazendo-se acompanhar por escasso ou inexistente investimento (uma má notícia). É também isso o que explica que a produtividade em Portugal esteja em queda desde 2014, questão a que me referi aqui há algumas semanas: quando o emprego cresce mais do que o produto, a produtividade, que corresponde ao rácio entre essas duas variáveis, diminui.
É por isso especialmente preocupante que os níveis de investimento da economia portuguesa estejam tão em baixo.
A economia retoma e depois cede. Vamos ver se agora não será assim, a retoma em toda a Zona Euro é mais visível e a recuperação do emprego também. Mas sem reformas corremos o risco de ceder.
Sem querer estragar a festa mas alertando para os perigos que corremos, a primeira prova de que esta recuperação da economia é duradoura será feira nesta segunda metade do ano, quando estivermos a comparar com a parte de 2016 que já registava um elevado crescimento. Neste momento ainda estamos a confrontar a evolução do PIB com o desempenho frágil da primeira metade do ano passado, quando parecia que nos íamos de novo afundar.
Desde o fim da crise esta é a terceira vez que a economia portuguesa arranca e depois fraqueja. Têm sido quatro anos de solavancos, em grande medida ditados pela evolução da economia europeia. Sem dúvida que desta vez a recuperação é bastante mais visível, nomeadamente pela criação de emprego e pelo aumento do investimento. Mas neste momento o que está a alimentar o crescimento é procura interna, mau sinal para um país endividado.
Se acaso for necessário o governo deve optar em deixar deslizar o defice para não prejudicar a retoma da economia. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) não abre mão das metas do défice, mas prefere defender a economia. Oxalá o governo não seja mais papista que o Papa e perceba este conselho. A economia portuguesa tem que aproveitar o momento de retoma das economias da Zona Euro para aumentar as exportações e regenerar o tecido empresarial. O defice não precisa de baixar de 4,9% para 2,5% num só ano, pode fazê-lo em dois anos.
Nos últimos meses de 2013 o turismo interno já deu mostras que o pessoal está farto de troika e de chuva. Implosão social? Qual quê? Hotéis cheios na Serra da Estrela, Madeira e Algarve. E há muito que um ano não começava de maneira tão promissora como este 2014. Os sinais de retoma chegaram ao turismo. Razões psicológicas dizem os responsáveis. A classe média alta e alguma classse média baixa reduziram muito o consumo nos últimos três anos, não por razões financeiras, mas por precaução. Andavam fastasmas no ar. Agora retomaram o consumo nomeadamente as férias fora de casa. Está a passar a ideia que o pior já lá vai, as pessoas estão fartas de narrativas miserabilistas.
E as termas, os solares e casas de turismo de habitação está tudo cheio ou para lá caminha. "Há um crescimento do número de reservas de portugueses para este carnaval e as perspectivas para a Páscoa são também animadoras." Cuida-te, Seguro!
O insuspeito Financial Times alinha no coro. Portugal está numa fase boa. "“o crescimento homólogo de 1,6% no último trimestre de 2013 superou qualquer outro membro da Zona Euro, incluindo a Alemanha, ao passo que esse mesmo crescimento, face ao trimestre anterior, foi de 0,5%, sendo ultrapassado apenas pela Holanda e arrasando as estimativas dos economistas, que apontavam para um aumento de apenas 0,1%”.
O jornal recorda também a descrição que Christian Schulz – economista sénior do Berenberg – fez de Portugal, ao classificá-lo como “a nova vedeta do crescimento na Zona Euro” e ao dizer que a crise da dívida soberana na União Europeia tem sido “a servente da mudança”, obrigando os Estados-membros, como Portugal, a procederem a “reformas estruturais profundas” e a melhorarem a sua competitividade nas exportações.
“Portugal, e não a Espanha, é a maior surpresa positiva na periferia do euro”, afirmou recentemente Ralph Solveen, economista do Commerzbank, citado pelo “FT”. “Ao contrário de Espanha, a taxa de desemprego já desceu significativamente e o emprego tem estado a crescer desde a Primavera”, acrescentou Solveen.
Ainda sobre as exportações, o jornal britânico dá como exemplo o sector do calçado [crescimento de 8% em 2013], “que usa o aeroporto da Portela para enviar encomendas individuais a clientes de topo, como a realeza britânica, e a celebridades, como David Beckham e Madonna.
E Portugal está também a atrair mais visitantes, sublinha o “FT”. “Em Julho do ano passado, nas entranhas daquela que foi a mais dura recessão que o país viveu em 40 anos, abriu uma nova área comercial no aeroporto da Portela, com 20 lojas ‘chiques’, para servir o crescente número de turistas”.