A contagem do tempo de serviço que confronta governo com os sindicatos é uma pedra no sapato orçamental. Não há dinheiro e se for concedido o que os professores exigem pode ser uma Caixa de Pandora . Outros sectores da função pública se seguirão na exigência. E é despesa para sempre.
É, claro, que em ano de eleições o PCP e o BE estão contra o governo a que se junta o PSD deixando o governo isolado na Assembleia da República. Mas antes o assunto queima nas mãos do Presidente da República. Promulga ?
Contas feitas, o executivo defende que entre a decisão já implementada de recolocar em marcha o relógio das carreiras e a eventual aceitação das exigências dos professores, estaria em causa "um aumento conjunto de 1154 milhões de euros" nas despesas anuais com os vencimentos dos professores, em 2023, por comparação com 2017.
A serem boas, estas projeções implicam que a proposta do governo de devolver dois anos e nove meses de serviço aos docentes já representaram um esforço de cerca de 180 milhões de euros anuais a partir de 2023.
Os sindicatos dizem que não, há professores mais antigos e que ganham mais e que vão para a reforma e, por isso, o montante é inferior, como se não fossem substituídos por jovens que vão empurrar todos os outros mais velhos para os níveis mais elevados.
Não há dinheiro o que é que não percebem ? Claro que vão chegar a acordo são muitos votos em jogo.
Os professoresmerecem todo o nosso respeito. Mas os juízes, os militares, os diplomatas, os polícias, os médicos e os enfermeiros, para citar apenas alguns outros sectores, não merecem menos. Para além destes corpos há toda a sorte de funcionários das finanças, da segurança social, no apoio à agricultura, às exportações, às empresas, há auxiliares de educação, há gente que ainda ganha menos do que o mínimo para não estar em risco de pobreza. No Estado? Sim, no Estado.
E não pode haver para uns e não haver para outros. E, para todos, não há.
Para cisões estúpidas já basta a que se criou, com algum sucesso, entre trabalhadores do privado e do público – cujas sequelas perduram e não sei se não serão permanentes. Não vamos agora permitir que os egoísmos corporativos repliquem essas divisões entre os funcionários públicos. Dividir para reinar só resulta se quem vive do seu trabalho, qualquer que seja o empregador, qualquer que seja a profissão, deixar. E o meu repto é este: não deixem, não cedam à tentação. O preço a pagar pode ser pior do que o que nos foi a todos imposto na última crise. Muito pior. Por mim, não quero saber o que será ver ainda mais famílias, meus vizinhos, meus colegas, meus amigos, meus conhecidos, verem-se sem poderem acudir aos seus. Já chegou a última vez.
Na discussão do orçamento o governo disse hoje que não faz milagres quando se discutia o descongelamento das carreiras. Já todos sabíamos o governo é que só descobriu agora mas é tarde .
É tarde para arrepiar o discurso com credibilidade, as várias corporações do Estado já estão em pé de guerra. O tema é difícil porque ele choca de frente com a narrativa em que se tem baseado o Governo da "geringonça" - a de que a austeridade aplicada em Portugal nos últimos anos se deveu fundamentalmente à vontade da direita de aplicar o seu programa ideológico. Com a esquerda no poder, a austeridade seria removida, rapidamente e para a eternidade.
Como se o anterior governo não tivesse governado a partir de uma situação de pré-bancarrota, ajoelhado perante os credores internacionais . O que António Costa e os partidos da esquerda nos quiseram fazer crer é que a direita governou como governou por ser má, enquanto a esquerda é boa.
Mas agora não há dinheiro o governo não tem como dar tudo a todos como prometeu, mas atirar o encargo orçamental para o futuro é uma imoralidade, serão os próximos governos a suportar uma despesa enorme e eterna.
António Costa de cabeça perdida e desorientado tenta nova fuga . Anuncia a deslocação do INFARMED para o Porto ( somos muitos descentralizadores, não somos ?) e ao mesmo tempo deixa ao bom senso ( ou à falta de senso) dos sindicatos (PCP e BE) a decisão quanto à recuperação das carreiras.
Uma espécie de " vejam lá se resolvem isso ", enquanto se queixa de falta de dinheiro ele que andava a prometer tudo a todos. Disse que não, disse que talvez, disse que sim e finalmente(?) disse que não. Mas como não quer sofrer sozinho os custos da decisão procura desesperadamente envolver os seus apoios e na falta deles a oposição.
Do largo do Rato chegam sinais de desconforto com o atual estado de coisas. O PS que já fazia contas à maioria absoluta não caminha em boa forma para as legislativas. Os tempos que se seguem não serão fáceis. O PSD com nova liderança marcará mais a agenda e vai crescer nas sondagens. Mas o grande desgaste do Governo virá das esquerdas. Os parceiros tornaram-se a verdadeira oposição. E o Presidente Marcelo, como agora se viu, não deixará de intervir sempre que discordar das escolhas. António Costa sabe que o rumo dos acontecimentos e o fim do seu estado de graça são bem concretos. Costa é cada vez mais o primeiro-ministro de um Governo minoritário. E isso é tudo menos abstrato.
É uma espécie de Caixa de Pandora que foi aberta e agora ninguém sabe como fechá-la. Há nisso alguma surpresa ? Não previram ? Ou a ideia era mesmo esta ? Colocar o governo perante uma decisão que não tem nem de perto nem de longe cobertura orçamental.
O governo quer acabar com a progressão automática das carreiras na função pública. E faz bem . É que não é só insustentável financeiramente como é injusto ao tratar todos por igual .Uns merecem progredir outros não.
Para uma inflação de, digamos, 2% o aumento de salários deveria andar pelos 2,5/3% mas a massa salarial anda sempre pelos 4/5% . A progressão automática nas carreiras destrói qualquer equilíbrio orçamental . E todos os anos a este aumento acumulado muito superior ao aumento da economia soma-se mais uma parcela.
Se bem me lembro foi Cavaco Silva, o homem que nunca se engana nem tem dúvidas, que introduziu esta bomba atómica na massa salarial da administração pública. Pelos vistos vai chegar ao fim e ser substituída pela avaliação . Que dirão a isto os sindicatos o PCP e o BE com o seu particular populismo ? Também é verdade que a progressão automática nas carreiras está há vários anos congelada ( não haver dinheiro tem destas coisas obriga a olhar e reconhecer os problemas ) .
As coisas são como são e o que tem que ser tem muita força. De vagar, devagarinho, o que é sensato vai ganhando terreno .