Explico todos os medicamentos e vacinas que se estão a testar contra o corona virus, neste artigo publicado hoje no Jornal da minha querida Sesimbra "Raio de Luz." Preferia estar a trabalhar da minha casa em Sesimbra a ver o oceano Atlântico do que desta em Oxford a ver o rio Tamisa, mas é um prazer daqui informar queridos conterrâneos. Nota: Estes dados são válidos até à data. Como estou a acompanhar estes desenvolvimentos de perto (inclusive ensaios aqui em Oxford no Reino Unido, além de outros ensaios liderados de Boston nos EUA, onde trabalhei antes muitos anos e onde tenho muitos colegas e amigos na indústria farmacêutica) manter-vos-ei atualizados noutras publicações aqui sobre mais ensaios e resultados. Entretanto leiam na imagem ou no texto do artigo colado em baixo:
(Potencial) Arsenal terapêutico credível na guerra contra Covid-19: Vacinas e Medicamentos.
O corona vírus 2 do síndrome agudo respiratório grave (SARS-CoV-2), desde que surgiu num mercado de morcegos e outros animais selvagens para comer em Wuhan na China, já infectou 350 000 pessoas e matou 15 000. Como esta doença do corona vírus surgiu em Dezembro de 2019, chama-se Covid-19.
A epidemiologia, ciência que mede como as doenças infecciosas se espalham em populações, estima que se não se fizesse nada, nos próximos quatro meses o vírus mataria meio milhão de pessoas no Reino Unido e, extrapolando, 80 000 em Portugal. Sendo que quanto mais idosas e mais doenças tiverem as pessoas, maiores são as probabilidades de fatalidades. A nossa própria maneira de viver pode ser ameaçada, com consequências devastadoras não só para a economia, mas para toda a sociedade. Bactérias e vírus já destroem cidades desde o início da civilização na mesopotâmia há 7000 anos.
Estamos pois numa guerra contra um inimigo invisível mas terrível. Uma vez que este inimigo é tão recente, não há ainda arsenal de vacinas e medicamentos contra ele. Até estes serem desenvolvidos, as únicas medidas que Portugal e outros países podem tomar por agora, são medidas não farmacêuticas como o fecho das escolas e o isolamento em casa.
Obviamente isto não pode continuar para sempre. O objetivo é que, entretanto, além de se manter o número de infetados baixo e espaçado para que o sistema de saúde consiga lidar com o número de doentes, se dê tempo à indústria farmacêutica de fabricar armas poderosas para esta guerra.
Felizmente há esperança e as companhias farmacêuticas estão já, muito mais rápido do que o habitual dada a urgência da guerra, a desenvolver novas vacinas e medicamentos.
As vacinas mais rápidas de desenvolver contra este vírus não são as tradicionais mas sim de RNA mensageiro (mRNA) que é uma molécula com instruções para as nossas células fazerem proteínas que combatam o vírus caso ele apareça, por exemplo que não deixem as proteínas do próprio vírus ligar-se a células humanas ou replicar-se dentro delas.
Na companhia BioNTech em Mainz na Alemanha, o Professor Ugur Sahin, com o apoio dos Americanos da Pfizer e dos Chineses da Fosun, já está a testar uma vacina assim em ratos. Os ensaios em humanos vão começar em Abril. Esta companhia começou logo a trabalhar na vacina em janeiro deste ano e tem já 400 cientistas a trabalhar exclusivamente no Covid-19. Só promete para já trabalho e não datas especificas para encontrar uma vacina bem sucedida de entre as várias que vão desenvolver e testar.
No instituto Jenner da Universidade de Oxford na Inglaterra, de onde este autor escreve para Sesimbra, a professora Sarah Gilbert, especialista em vacinas contra vírus e fundadora da companhia de vacinas Vaccitech, planeia testar em humanos já em Maio, uma vacina desenvolvida em Oxford, mas fabricada pela companhia italiana Advent. No entanto, primeiro tem de ser realizados ensaios em animais que começam esta semana na Porton Down, um laboratório britânico militar, ligado historicamente à atual companhia farmacêutica do autor. O governo britânico, afirma que, no melhor dos casos, esta vacina poderia já ser aprovada, sem ter todos os ensaios completos, pela agência regulamentar inglesa (MHRA) no final do verão de 2020.
Nos EUA, a companhia Moderna, Inc. juntamente como o instituto de doenças infecciosas dos EUA (NIAID) de Anthony Fauci, um epidemiologista que foi um herói na guerra da humanidade nos anos 1980 contra o vírus da SIDA e que podem ver ao lado do presidente Trump nas conferencias de imprensa deste, iniciou já a semana passada em Seattle (EUA) um ensaio clinico de fase 1 com a uma possível vacina, designada mRNA-1273.
Os Americanos são mais cautelosos nas promessas que os Ingleses. Acham que podem demorar 12 a 18 meses até terem uma vacina aprovada pela agência regulamentar americana do medicamento (FDA). Isto porque primeiro tem de terminar estes ensaios de fase 1 com dezenas de voluntários, depois fazerem ainda ensaios de fase 2 com algumas centenas de pessoas e finalmente de fase 3 com muitas centenas. Só nessa altura saberão se a vacina é segura e eficaz para poder ser usada em milhões de pessoas não infectadas para estas não contraírem nem espalhar o corona vírus pela comunidade.
Entretanto uma tarefa potencialmente mais rápida que inventar uma vacina para o novo corona vírus, é encontrar um medicamento que, naquelas pessoas já infetadas, pare ou reduza a multiplicação do vírus para que as consequências da infeção não cheguem ao ponto trágico das imagens que nos chegam de Bergamo na Itália, onde muitas infetados só conseguem respirar com ajuda de ventiladores ou nem isso.
Aqui o ideal seria que os medicamentos anti-virais já existentes, logo que já se sabe que são relativamente seguros na guerra contra outros vírus, funcionassem especificamente contra o novo corona vírus.
O remdesivir produzido pela Gilead na Califórnia, EUA, contra o vírus ebola demonstou resultados em casos relatados de doentes infectados com Covid-19. Um ensaio clinico inicial em humanos começou a decorrer em vários países, levará pelo menos 2 meses mas tem já cerca de 600 doentes a ser testados.
O kaletra (lopinavir e ritonavir usados normalmente contra o HIV ou vírus da SIDA) da Abbvie também poderá ser útil no princípio da infecção, mas um ensaio clínico na China em 200 doentes falhou em doentes já em estado avançado da infeção muito grave. Há também um ensaio paralelo mais pequeno em Hong Kong com menos de 100 doentes, mas que demorará 29 meses. No entanto vai-se iniciar brevemente um grande ensaio clínico internacional com mais de 300 doentes, para ver se o kaletra funciona em doentes recentemente infetados.
O fapiravir da Fujifilm num ensaio com 340 doentes chineses também mostrou ser promissor se administrado no início da infeção, mas não para doentes avançados.
A cloroquina (em combinação com a hidroxi-cloroquina) descoberta na Bayer em 1934 contra a malária e com propriedades anti-virais, demonstrou agora num primeiro pequeno ensaio clínico em 24 doentes na França que pode ajudar a combater o corona vírus. Os EUA e a OMS começaram ensaios clínicos maiores, com cerca de 200 doentes durante 6 meses para tentar confirmar a segurança e eficácia.
Por último, em termos de anti-virais, a companhia farmacêutica britânica Synairgen, vai iniciar em breve um ensaio clinico com SNG001, um interferão beta, normalmente para infeções pulmonares.
Além dos medicamentos anti-virais acima descritos também se estão a testar medicamentos anti-inflamatórios. Estes são para travar a reação excessiva do sistema imunitário contra o virus que pode levar à morte.
A companhia francesa Sanofi e a britânica Regeneron estão a testar em 400 doentes americanos, se o Kevzara, normalmente usado na artrite reumatoide, também pode ser usado para evitar as reações imunitárias mais graves em doentes com Covid-19.
A companhia suíça Roche também vai testar já a partir de Abril e em cerca de 3000 doentes se o seu medicamento para artrite reumatoide, Actemra, também funciona no Covid-19.
A última categoria de possíveis novos medicamentos contra o corona vírus são os anticorpos adaptados daqueles que anticorpos produzidos naturalmente no corpo humano que são observados nas pessoas infetadas cujo sistema imunitário conseguiu combater o corona vírus.
A Regeneron está já a desenvolver dois desses anticorpos que testará em ensaios clínicos no verão. Na China há um ensaio clinico com um anticorpo aplicado a cerca de 300 doentes que está previsto demorar 4 meses.
Finalmente, na China, em Wuhan, onde tudo começou, está a decorrer um ensaio clinico com 2000 doentes e que demorará pelo menos 5 meses, comparando muitos dos tratamentos acima descritos para tentar estabelecer qual o mais seguro e eficaz.
Concluindo, há muita atividade na indústria farmacêutica para encontrarmos armas para vencer este inimigo invisível. Dados os resultados passados demonstrados por esta indústria contra tantos vírus como os de várias hepatites, ou do sarampo, rubéola, varíola, e, mesmo que parcialmente, SIDA, obviamente há razoes para ter esperança que também vão aparecer vacinas e/ou medicamentos contra a Covid-19.
A incógnita principal parece ser o tempo que vai demorar até termos tal arsenal terapêutico que mude o rumo desta guerra a favor de uma humanidade unida pelo inimigo comum Corona vírus. Isto porque a maioria dos ensaios clínicos em humanos descritos neste artigo vão falhar ou demorar mais tempo do que os planos mais otimistas. Isto como é normal dada a complexidade do problema, (por exemplo mutações virais e diferentes estirpes do corona vírus) e este autor sabe por experiencia própria de duas décadas a trabalhar na indústria farmacêutica multinacional nos EUA e Europa do Norte.
Pedro Caetano
Diretor Global da indústria Farmacêutica
Condado de Oxford, Inglaterra, Reino Unido
Ex professor de Epidemiologia e Farmacologia na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. Doutorado em Farmacologia, Doutorado em Farmácia Clinica, Mestre em Saúde Pública, e Certificado em Farmaco-Epidemiologia respetivamente pelas Universidades de Michigan (EUA), Ohio State (EUA), Harvard (EUA) e London School of Hygiene and Tropical Medicine (Reino Unido).