Somos uma sociedade livre, somos responsáveis pelas próprias decisões, seguimos o que queremos e o que gostamos.
Vivemos numa sociedade livre, mas parece que iremos suspender essa liberdade por um par de meses. E essa perda é para garantir que os cidadãos alcancem os bens de que necessitam. Se vivêssemos numa economia planeada este seria o nosso dia-a-dia: comprávamos o que alguém decidia que comprássemos, na quantidade que achariam adequado, no local em que alguém decidiu. Mas não vivemos. E por isso a mudança nas nossas vidas vai ser muito dura. E será mais dura porque temos memória e sabemos como é boa a vida que tínhamos há um mês atrás!
Muitas empresas irão soçobrar, muitos trabalhadores irão ficar desempregados. Há que garantir que continuam a ter acesso aos bens necessários, ou seja, que têm poder aquisitivo nas suas contas de depósito de forma muito rápida. Isso consegue-se salvando as empresas com injeções de liquidez imediata (não com linhas de crédito de acesso retardado e difícil) ou com dinheiro direto para as mãos dos trabalhadores. Porém, há que o fazer sem arrastar o problema para o sistema financeiro de modo a fazê-lo implodir.
Temos que ganhar a guerra na frente sanitária sem perder a guerra na economia.
Há, antes de tudo, as liberdades e garantias que com o estado de emergência podem estar à mercê da discricionariedade do Estado. O medo leva as pessoas a esquecerem-se e com isso estamos a abrir as portas ao pior que o Estado tem.
Depois o estado de emergência vai aprofundar o que já está à vista. As pessoas fecharam-se em casa. O turismo está a levar uma facada de todo o tamanho e com ele os sectores a montante e a jusante ( restaurantes, hotéis, alugueres, transportes incluindo o aéreo...)
Fábricas que param a produção, algumas delas já não abrem, outras nunca mais serão as mesmas. O sector da distribuição encolheu e vai levar tempo a voltar à dimensão anterior.
O desemprego voltará a atingir um nível muito elevado ( mais cerca de 340 000 desempregados) voltando ao nível de há cinco anos com um cortejo de dramas e prejuízos. Famílias a braços com problemas de créditos que não conseguirão honrar.
O estado voltará aos défices, com mais despesa e menos receita, fruto da redução do PIB.
O dinheiro de helicóptero deitado sobre os países que a União Europeia irá disponibilizar, ajuda a tesouraria de empresas e famílias mas levará tempo para chegar à economia.
A ganância ocidental levou para a China e vizinhos uma fatia importante da cadeia de valor da produção e, descobriu agora, que não tem nas suas mãos todo o poder para mudar a curto prazo esse estado de coisas.
Entretanto, há milhares de portugueses emigrados que tentam voltar com medo de ficarem doentes e desempregados . Mas não há empregos à espera deles. E, além disso, quem fica em casa é porque não trabalha.
Centeno fala em impactos como no "tempo da guerra" e o desemprego voltará aos 15%.
Depois de decretada a emergência haverá quem queira alargar o período a um pretexto qualquer. Como exigir que o Estado mantenha alguns dos poderes que o estado de emergência lhe concedeu. Na economia que afinal se portou tão mal. Nacionalizar os hospitais que como se viu foram chamados a fortalecer o Serviço Nacional de Saúde. E que melhor do que ter um SNS forte e único ?
Ao fim de algum tempo as pessoas habituam-se à nova situação e vão cedendo ao autoritarismo do Estado.
"O autoritarismo é uma fonte de empobrecimento e, nos piores casos, pode ser tão ou mais mortal do que um vírus. Depois de vencermos este vírus, mesmo cansados teremos outra luta importante: vencer o autoritarismo. Que nessa altura estejamos cá todos para combater esse vírus da mesma forma que combatemos este: com distanciamento social em relação a todos os oportunistas autoritários. Este vírus levará muitas vidas, mas é importante que quando for derrotado não sirva também para que nos levem a liberdade."
Na China o "XI não sei quê" fez desaparecer quem avisou os seus concidadãos. Na Rússia o Putin eternizou-se no poder revendo a constituição. Na Venezuela o Chavez deixou na presidência um atrasado mental seu seguidor. Em Cuba Fidel deixou o irmão.
O medo leva as pessoas a ceder. No momento em que nos esquecermos disso, estaremos a escancarar as portas ao autoritarismo do Estado.