Há pouco mais de meio ano, Cavaco e Silva, de uma assentada, violou duas obrigações que a CRP lhe comete.
Nomeou um primeiro-ministro sem ter em conta os resultados eleitorais, segundo o único critério compatível com o texto da lei e que, até ele, repetidamente e sem excepção, sempre fora o de todos os presidentes; subjugou-se à indicação do parlamento, que pode demitir governos, mas não pode nomeá-los, abdicando, assim, da competência própria e exclusiva, que colhe da legitimidade na eleição por sufrágio directo e universal.
Hoje, os sinais deletérios são evidentes, não obstante a competente propaganda e o novo estilo “flash interview” do titular que lhe sobreveio.
Aqui ao lado, fruto de uma constituição mais reguladora do que tem de ser regulado e da serenidade do Chefe do Estado, o país esteve seis meses com um governo de gestão. Sem dramas e sem prejuízos; sem orçamento aprovado para o ano em curso, mas, nem por isso, sem orçamento; sem convulsões ou crises, sem agravamento do risco da dívida e sem dificuldades de acesso a financiamento. Também sem sobressaltos no curso da sua economia. Ainda sem pressões dou ralhetes “de Bruxelas”
O povo espanhol, cuja opinião, essa sim, foi tida em conta, disse, novamente, o que queria – o mesmo que tinha dito em Dezembro, mais enfaticamente. Caberá aos partidos entenderem-se e os que se recusarem ao entendimento fora do que é razoável e do que dois actos eleitorais sucessivos ditaram, arrostarão as necessárias consequências nas urnas. Daqui a mais uns meses, é certo, e, como até aqui, sem crises ou convulsões.
Cavaco poderia corar de vergonha, no retiro fausto e dourado que a república lhe consente. Se alguma vez tivesse percebido o que se espera de um Chefe do Estado.
Que, a coberto da limitação de poderes pela proximidade do fim do mandato, acabou por comprometer-nos, muito para além deste. Por cobardia ou convicção, nunca saberemos.
E, no nosso caso, teria sido bem mais simples do que em Espanha, já que, em novas eleições, apenas teríamos, na prática, de dizer – queremos um governo de coligação com comunistas? O que poderia estar já resolvido desde o passado Abril.
Os problemas sérios que aí vêm radicarão numa decisão bem fácil, mas profundamente errada.
Nas vésperas das eleições, tinha já estudado, "cuidadosamente", todos os cenários pós-eleitorais possíveis.
Não faltou às cerimónias do 5 de Outubro (onde uma personagem como ele faz evidente falta) por causa das eleições. já que, apesar de ter todos os cenários estudados, "cuidadosamente", e conhecida, que então já era, a relação de forças no parlamento, não tratou de, rapidamente, ouvir os partidos.
Faltou, portanto, provavelmente, para estudar. Provavelmente, também, para estudar "cuidadosamente". Porém, não se vislumbraria bem o quê.
Depois de arrastar o mais que pôde as diligências preliminares à nomeação do primeiro-ministro, mais de vinte quatro horas sobre o seu termo, urgindo que o país tenha governo e quando tudo estava “cuidadosamente” estudado, continuamos à espera.
Parece-me certo que o presidente está a estudar. “Cuidadosamente”.
Mas, agora, passadas quase três semanas de intenso e cuidadoso estudo, parece-me vislumbrar o que o presidente estuda, “cuidadosamente” - a melhor maneira de pôr a PAF na oposição. Porque isso de um líder do seu partido renovar mandatos era só no tempo dele e com a sua gente.
Cavaco e Passos estão neste momento reunidos em Belém . Amanhã e 4º feira serão ouvidos os partidos e logo depois Cavaco indigitará Passos Coelho como primeiro ministro. Vamos ficar todos à espera que, por uma vez, Costa cumpra o seu dever . Deixe passar o programa e o orçamento para 2016 . Após a tomada de posse do novo presidente da República ficamos todos à espera que, pela segunda vez, Costa cumpra o seu dever. Derrubar o governo legítimo em funções.
Depois , como apontam já as sondagens, levará o PS a uma derrota eleitoral ainda mais pesada, com maioria absoluta da Coligação.
O PS de Costa ficará bem acompanhado com o BE de Catarina "a sem limites ". Entretanto, o PCP ficará onde sempre esteve. Defender a sua própria sobrevivência. Lá mais para a frente veremos o BE rever as suas bandeiras anti Europa e anti Nato como já fez o Syriza na Grécia e o PODEMOS em Espanha. E aí o PS entrará em convulsão profunda.
É que para surpresa de Costa e acompanhantes o BE, erguido por Costa ao estatuto de partido do governo, não terá limites .
Num dos melhores programas de analise política da televisão portuguesa, um frente a frente de António Vitorino (PS) com Santana Lopes (PSD) ambos concordaram que a Constituição determina ser o líder do partido ou coligação mais votada a ser indigitado primeiro ministro. Tenha ou não maioria absoluta.
Santana Lopes, afirmou mesmo que nestes dias, teve a curiosidade de procurar as actas das reuniões da Assembleia da República ( 1987) onde este assunto foi discutido pelos vários constitucionalistas, e onde é claro que o espírito da Lei é mesmo o que depois foi seguido na prática. O presidente da República indigitar como Primeiro Ministro o partido ou coligação que teve mais votos e mais deputados.
Ambos os juristas e políticos não têm nenhuma dúvida que é isto mesmo que vai acontecer. Cavaco Silva vai empossar Passos Coelho como primeiro ministro e a partir daí as negociações prosseguirão na Assembleia da República.
E se o governo não passar não é obrigatório o presidente da república chamar o segundo classificado. Pode dissolver a Assembleia ( como fez Jorge Sampaio quando existia uma maioria absoluta) e avançar para eleições antecipadas.
Cavaco não pode, nestes últimos seis meses do seu mandato, dissolver a Assembleia mas pode manter um governo de gestão ou de iniciativa presidencial até à tomada de posse do próximo presidente da república,( ambos dizem que Marcelo ganha à primeira volta) o qual também não pode dissolver a Assembleia da República nos seus primeiros seis meses de mandato. Após esse prazo ( Julho de 2016 ) as eleições antecipadas podem ser decretadas.
Outra questão curiosa levantada é que quer Mário Soares quer Jorge Sampaio quando deixaram o palácio de Belém deixaram em S. Bento um governo da sua cor política. Não se peça a Cavaco Silva que seja o primeiro e único que ofereça numa bandeja o exercício do poder a quem perdeu e que não é da sua cor politica.
As decisões que forem tomadas pelos partidos na Assembleia da República para derrubar o governo (como obstrução à governação, chumbar o orçamento, ou apoiar uma moção de censura ) serão depois apreciadas pelo povo nas eleições seguintes.
Não fora a generalidade da comunicação social simples caixa de ressonância da esquerda a que se chama “esquerda”, seria surpreendente a ideia instalada segundo a qual Cavaco tem sido o apoio de Belém ao governo da maioria ora PAF.
Quem o proclama não faz a contagem comparativa dos vetos e pedidos de fiscalização a diplomas desta maioria com os emanados das maiorias de Sócrates.
Não pondera a circunstância de, em 2009, ao contrário dos pruridos que agora exorbita, Cavaco ter dado posse a um governo PS sem apoio parlamentar maioritário. Fê-lo placidamente, sem apelos a soluções de consenso alargado, apesar de, já então, o país estar mergulhado em apertadíssima situação económica.
Não atenta em que, há dois anos, prolongou com elevados custos uma crise governativa que o primeiro-ministro resolveu num ápice de dois dias, tentando esforçadamente levar os socialistas ao governo e dar-lhes de bandeja o que mais queriam – eleições antecipadas.
Esquece que, ainda em 2011, anunciados os cortes salariais da função pública, fez uma incrível imputação de falta de equidade fiscal, ao, na sua perspectiva, poupar os demais trabalhadores do esforço do ajustamento. Foi aí, recorde-se, que começou a ajustar-se pelo incremento da receita e não, como deveria ter sido, pela redução da despesa. Com socialistas e comunistas a aplaudirem a posterior decisão do TC nesse mesmo sentido.
Chegados ao Outono de 2015 e Inverno avançado da sua presidência, o presidente encarregou Passos de obter consensos.
Quando era a ele, presidente, que competia obtê-los.
Cinco anos depois de, no lançamento da sua segunda candidatura, ter puxado dos galões e proclamado, num vitupério de auto-elogio, a eficácia da sua “magistratura de influência”, na qual ninguém tinha reparado.
Uma vez mais, são os socialistas e comunistas quem exulta e, à sua maneira, dão prática às palavras do presidente.
Tenho, para mim, que Cavaco não consente que haja quem, apesar de tudo, venha a fazer mais e melhor do que ele conseguiu, em muito melhores circunstâncias. Não aceita deixar de ficar para a história como o melhor líder do seu partido ou passar à posteridade sem ter sido o primeiro-ministro coincidente com o maior ciclo de prosperidade dos últimos quarenta anos; ainda que a prosperidade tenha sido aparente e à custa do dinheiro alheio.
Nem que, mais tarde ou mais cedo, os portugueses venham a penar novo ajustamento forçado, contanto que ele, juntando-se aos nababos antecessores, esteja a fruir recatadamente dos privilégios da sua república.
Este presidente não é flor que se cheire. Para não desmerecer.
Como o Presidente da República só pode indicar o primeiro ministro depois de " analisados os resultados das eleições e ouvidos os partidos" e como nenhuma das condições indicadas está preenchida , infere-se que a declaração a proferir hoje seja a que faltou no dia da implantação da República.
Depois de ter ouvido Passos Coelho, cujo governo já anda aí pela comunicação social ( o telefone nunca mais toca) e tendo em conta que no PS ainda nem se sabe se António Costa, muito fragilizado politicamente, terá condições para representar o partido , esta declaração pública só vem confirmar que na cabeça de Cavaco há muito que, centímetro a centímetro, está lá tudo.
Também é verdade que aqueles apelos do PCP e do Bloco de Esquerda para um governo de esquerda é um faz de conta e o melhor mesmo é não perder tempo, mas convinha que " a gata com a pressa não tivesse os filhos cegos".
Ou será que a audição já foi feita ao 6º grupo parlamentar ? O grupo de deputados seguristas que foram atraiçoados e que agora podem viabilizar o governo com os seus quinze deputados ?
Agora é preciso que o governo faça o seu trabalho que é privatizar uma empresa que, todos os dias, perde valor e cujos sindicatos fazem greve porque os pilotos querem ficar com 20% do capital gratuitamente. Acham que é "serviço público" . Como se alguém comprasse uma companhia em que 20% do capital social estivesse nas mãos de uma pequena parte dos seus trabalhadores.
António Costa também veio com aquela peregrina ideia de o estado manter a maioria do capital social e dispersar o resto em bolsa. A ideia é muito boa não fosse o pequeno senão de ninguém investir o seu dinheiro numa empresa que para dar lucro vai ter que passar por uma fase de reestruturação. Sim, limpando o que há a limpar por forma a que os custos por avião sejam iguais à concorrência. Sem isso a TAP vai à vida, a não ser que continuemos a meter lá os nossos impostos como fazemos em tantas empresas públicas falidas e permanentemente em greve.
Não é viável, não é possível. O que é que não compreendem ? A TAP está a vender aviões para pagar os vencimentos.
O Governo recebeu quatro manifestações de interesse nesta privatização: de um consórcio liderado pelo empresário português Miguel Pais do Amaral e pelo milionário norte-americano Frank Lorenzo, da espanhola Air Europa (detida pela Globalia), da brasileira Azul e ainda de Gérman Efromovich. Mais recentemente, também a brasileira Gol pediu mais detalhes sobre a operação.
Um governo que em cinco anos passa de um apoio maioritário na Assembleia da República para uma minoria reúne todas as condições para que tudo ou quase tudo corra mal. Cavaco Silva sabia isso melhor do que ninguém mas mesmo assim deu posse a Sócrates . As presidenciais estavam no horizonte o melhor mesmo era não despertar forças adversas.
José Sócrates, com a sua imensa auto estima e convencimento, encenou uma farsa de negociações com os restantes partidos. O que chegou à opinião pública é que apesar de todas as boas intenções nenhum partido quis negociar a participação no governo. Se foi assim era porque o pântano já estava instalado e pouco havia a fazer.
O que nos foi oferecido pelo governo foi um processo Kafkiano, um delírio que acabou com o país a pedir ajuda externa e a semanas de entrar na bancarrota. Um primeiro ministro que não ouvia ninguém embora até do seu ministro das finanças lhe chegassem avisos cada vez mais estridentes. Agarrou-se desesperadamente aos PEC que não eram mais que pedidos de ajuda externa mas que não concediam permissão de entrada aos técnicos do FMI e do Eurogrupo.
O estado a que o país tinha chegado era bem pior do que alguma vez alguém se atreveu a pensar. O ex-primeiro ministro, enquanto teve dinheiro para gastar ( e mesmo quando já não tinha mas os negócios ainda eram possíveis) foi levado aos ombros sem que a sua imensa vaidade lhe permitisse ver que " o rei ia nu ". Os mesmos que o aplaudiam foram os mesmos que lhe passaram um bilhete só de ida.
Essa parte do país que viveu de delírios, de TGVs e de Novos aeroportos, está a cair como castelos de areia. Ainda há por aí quem veja no PEC IV a salvação que nos foi negada.
O discurso de Cavaco Silva no 5 de Outubro só tem o defeito de ter como autor o político com mais anos de vida política activa. De resto só diz verdades. Tem culpas no cartório? Não é só ele, temos todos. Votamos em partidos que se tornaram organizações carreiristas de gente medíocre. Aplaudimos o que tem a nossa cor mesmo que seja muito mau. E ninguém se mostra interessado em encontrar soluções e compromissos com vista ao interesse nacional.
O PCP é o retrato fidedigno desta situação. Não muda um milímetro seja qual for a situação ou o problema. Acusa todos os outros mas o que tem para oferecer é repudiado pela esmagadora maioria da população. Para os comunistas quem está errado é o povo que não vota neles. Para o Partido o que está em primeiro é a sua ideologia e os seus princípios . E nós sabemos todos o que aconteceu e acontece nos países que seguiram a via defendida pelo PCP.
Portugal é hoje um país desenvolvido, democrático, um estado de direito com um admirável estado social e está inserido no maior espaço económico; no espaço social mais justo e com maior qualidade de vida. Quem compreende que o PCP queira por tudo isto em causa?
As fotografias de Cavaco Silva desmaiado foram captadas numa cerimónia pública, nada a dizer. Outra coisa é utilizá-las para a chicana política. Ou se, (como se queixa alguma comunicação social ) tivessem sido tiradas quando o presidente estava a ser assistido pelo médico . A privacidade de um acto médico é um direito do doente e do próprio médico. Alguns não percebem isto, como não percebem a diferença entre os que lutam para que os direitos democráticos sejam exercidos e, aqueles outros, que só reconhecem alguns direitos, os que cabem no seu conceito de sociedade. Será uma luta de sempre. Entre o igualitarismo que arrasa a dignidade do ser humano e a Liberdade que a torna possível.