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BandaLarga

as autoestradas da informação

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A "viragem" da economia portuguesa de que fala Centeno aconteceu em 2013 e 2014 e não a seguir a 2015 !...

O Ministro das Finanças publicou um artigo no jornal "O Público" onde diz que a economia portuguesa está num ponto de viragem.

 

Diz a certo ponto :

"O país que agora vê o seu esforço de consolidação reconhecido é um país muito diferente daquele que atravessou uma das mais profundas crises financeiras de sempre. Portugal cumpre as suas metas e, por isso, a confiança dos agentes económicos está em máximos de muitos anos. O mercado de trabalho está em expansão, produzindo mais oportunidades. Hoje vale a pena ficar em Portugal.

Portugal apresenta uma situação orçamental equilibrada e sustentável, num contexto de crescimento económico, que assegura uma redução continuada da dívida pública em percentagem do PIB de agora em diante. 

Portugal alcançou (...) um défice reduzido e uma diminuição das taxas de juro da dívida, num contexto de crescimento económico e de criação de emprego. O Governo assume um compromisso firme para o futuro na continuação da melhoria das condições de desenvolvimento da economia portuguesa. 

Portugal voltou a ter perspetivas de crescimento sustentado, com o investimento empresarial a aumentar de forma significativa, (...) e com as exportações a registarem um crescimento robusto, quer nos bens, quer nos serviços.

A taxa de desemprego está em valores inferiores a 10%, a maior redução (...) na UE, enquanto o emprego cresce (...). (...). Uma evolução que constitui a verdadeira reposição de rendimentos, a que se junta, naturalmente, a redução efetiva da carga fiscal.

Também o endividamento externo em Portugal está hoje numa trajetória sustentável. O aumento das exportações, num contexto de aumento moderado da procura interna assente na criação de rendimento e não de endividamento, permitiu que o défice externo se tenha transformado num excedente externo, reduzindo, assim, a dívida externa portuguesa. Neste aspeto, o setor privado teve um papel muito importante, reduzindo o seu endividamento (...) desde o ponto mais alto da crise. 

A mais relevante alteração das condições de funcionamento da economia portuguesa prende-se com a estabilidade financeira, hoje, finalmente, uma realidade. Os bancos foram capitalizados e provaram a sua capacidade para atrair capital de todo o mundo, refletindo a confiança dos investidores internacionais na solidez da economia e numa estabilidade política, tantas vezes questionada, mas que, hoje, é invejada em muitas partes da Europa. Portugal não deve ter vergonha de ser um exemplo."

Apenas retirei da citação alguns detalhes e números da actualidade. 

 

O que é espantoso é que este retrato da economia portuguesa podia perfeitamente ter sido feito há cerca de dois anos atrás, em meados de 2015, quando estava em funções o governo anterior, antes das eleições legislativas de Outubro de 2015 e da mudança de governo em Novembro de 2015.

Mais : algumas das evoluções positivas que são agora sublinhadas eram então ainda mais evidentes. Por exemplo :

- "Portugal voltou a ter perspetivas de crescimento sustentado" : mas as perspectivas de crescimento em 2015 para os anos seguintes eram ainda maiores do que são hoje, apesar das condições externas serem hoje mais favoráveis do que eram na altura ; por um lado, a taxa de crescimento abrandou em 2016 e apenas em 2017, práticamente dois anos depois, recuperou o ritmo da altura ; por outro lado, as previsões sobre as taxas de crescimento nos anos subsequentes eram então de uma progressão regularmente ascendente, o que não acontece actualmente, com taxas positivas, é certo, mas em sentido descendente (a generalidade dos observadores concorda em que a razão principal se prende com o facto de não estarem a ser feitas nem estarem previstas reformas estruturais) ;  

- "uma redução continuada da dívida pública em percentagem do PIB de agora em diante" : mas esta redução começou efectivamente em 2015, tendo a percentagem descido abaixo dos 130%, e foi interrompida e invertida em 2016, estando hoje em cerca de 134% ;

- "uma diminuição das taxas de juro da dívida" : mas a taxa de juro da divida que mais reflete e impacta o custo da divida refinanciada é a de mais longo prazo, em particular a 10 anos, e esta práticamente duplicou desde o final do primeiro trimestre de 2015, apesar da generalidade das taxas equivalentes dos paises da zona Euro, com a excepção da Grécia, terem descido desde então ;

- "Portugal não deve ter vergonha de ser um exemplo." : mas Portugal era mais um exemplo antes do governo actual, em 2014 por ter concluido com êxito o resgate e ter regressado aos mercados, em 2015 por estar a crescer económicamente e a consolidar financeiramente ; tanto é assim que as agências de rating melhovam então as expectativas positivas do pais e que a UE se preparava para tirar o pais do procedimento de défict excessivo em ... 2016 !...; Portugal perdeu esse estatuto na segunda metade de 2015 e em 2016 era considerado como um caso problemático e preocupante ; e se hoje Portugal volta a ser considerado um exemplo não é tanto pelos resultados em si mas mais pela surpresa que é um governo apoiado por uma extrema-esquerda eurocéptica estar a seguir uma politica que não é de rutura mas antes de continuidade com a do anterior governo de direita.

Ou seja, a economia do pais teve efectivamente uma "viragem", saindo da recessão e passando a crescer, saindo da emergência financeira e progredindo na consolidação das contas públicas. Mas essa "viragem" não é de agora, ou sequer a partir de finais de 2015 quando mudou o governo ; ela aconteceu em 2013 e 2014 e estava a reforçar-se em 2015, antes da mudança de ciclo politico.

O que se tem passado no ano e meio de duração do governo actual, descontando uma certa perda de ritmo e de credibilidade externa entre 2015 e 2016 no seguimento de uma fase final da legislatura anterior marcada pela incerteza e pelo receio de uma mudança de politica e de uma primeira fase da nova legislatura que parecia confirmar essa perspectiva, e descontando ainda o completo abandono das reformas estruturais, tem sido sobretudo a constatação de uma continuidade relativamente ao essencial da politica e do modelo que vinha sendo seguido nos anos anteriores : "um aumento das exportações, num contexto de aumento moderado da procura interna assente na criação de rendimento e não de endividamento" e a continuação da "redução do déficit" orçamental permitindo manter "uma situação orçamental equilibrada e sustentável" (citações tiradas do artigo de Mário Centeno).

O que Mário Centeno acaba por reconhecer involuntáriamente é que a economia portuguesa recuperou significativamente desde o pico da crise em 2012 e 2013 e que não se registou recentemente nenhuma "viragem" para algo de novo e diferente.

Mais : se o ano de 2015 não tivesse sido cortado por eleições e pela mudança de ciclo politico, o mais provável teria sido a economia portuguesa não ter tido uma fase de abrandamento no processo de recuperação então em curso e estar hoje com melhores indicadores e com melhores perspectivas.  

Mas acontentemo-nos com o que temos !!

         

  

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