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BandaLarga

as autoestradas da informação

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A PERDA DE UM FILHO Prof Raul Iturra

Não é da morte que falamos, Schubert já o tinha feito música no seu texto musical de 1817 Der Tod und das Mäiden, en luso português: A morte e a donzela. A pessoa que amava, vai-se embora para não retornar e fica só. Isso é morte, a solidão voluntaria do abandono, o entendimento que não somos queridos porque a pessoa amada vai-se embora porque quer. Schubert, doente, fica só sem amigos que o acompanhem nem animais que façam barulho. Em breve, aos seus trita e três anos, ele desaparece levado por uma doença que no seu tempo não tinha cura, sem ser o formol, que mumifica a quem o usa. Um morto vivo.

A história de Franz Schubert (1797-1828) era de imensa música, escrita em apenas os 31 anos que viveu, da qual nos temos apropriado por ser fermosa, alegre y divertida. O seu desaparecimento foi uma perda para amigos y parentes. Não foi morte, a sua vida continua na sua obra e nos amores que ficaram pendurados da solidão de Schubert, da sua ausência, da obra de amar e ser amado.

As mas línguas atribuem a sua perca a atividades que ele nunca realizou. Mas, essa são mas línguas. Ele amava, ele era amado, ele acarinhava, ele era acarinhado. Um acidente de percurso, leva primeiro a Maria Teresa e a comemora em A morte e a donzela, esse quarteto de cordas que está sempre connosco. No amor à família de sua mulher e no desaparecimento quase voluntário dor do seu corpo. Como Beethoven, cheio de amor a sua música e a namorada que teve, que casou com outro e ele a imortaliza na sua 9ª Sinfonia, que começa com o poema de Schiller no seu 4º movimento: Amigos, mudemos o tono, sejamos felizes dentro das misérias da vida, obra de quatro horas de duração que parecem um pestanejar pela felicidade que causa em nós. Essa estreia foi vista e ouvida pela mulher que amou e tornou a ama-lo após ouvir a obra. Essa Amada Imortal para ele que, só de ouvir a música, soube perdoa-lo da ter deixado só e confessa-lhe que o filho que tinha, esse sobrinho, era de facto o filho dele, perto do tempo em que ele fora-se embora para sempre. Mas morre feliz porque sabe que é pai.

Há a perca e o ganho de um filho, há a perca e a lembrança da mulher que amamos. Choramos, sofremos, ficamos em desespero, mas dentro desta mesma vida, recebe-se a recompensa de se saber pai e a perca é mais leve. Não nos primeiros dias em que faltam lágrimas para chorar até as gastar todas. O luto é luto até a eternidade, leva tempo em passar porque em meio minuto a vida muda violentamente. Nem Schubert nem Beethoven tiveram tempo de luto. A alegria de ter amado, entontece os sentimentos, a alegria de termos sido amados, ainda que abandonados, faz da nossa vida uma eternidade que seixa de ser um pestanejar.

Também dois filhos foram-se-me embora. Consolar a mãe, não me deixara tempo para pensar na minha . Passaram anos para o meu monólogo se Segismundo, esse  que A vida é sono, que o poeta estremenho Pedro Calderón de la Barca escrevera em 1653 y que começa com un indevido lamento: Ai mísero de mim, ai infelice. Apurar céus, pretendo, porquê ma tratades assim. Ainda que si nasci já entendo, porque toda a vida e sono, e os sonos, sonos o são. (Castelhano antigo) En desespero, Segismundo, aprisionado para não ser rei, encontra remedio para o seu dissabor amando-se a si próprio e lembrando todos os seus vinte anos que amou e foi amado e abençoado. O lutos da perca de um filho, a descoberta de uma paternidade, a música para Teresa, o amor para o ego, são o remédio para o luto.

O problema é que amamos tanto, que esquecemos do nosso ego e se um filho é perdido, apenas sabemos de nós quando a nossa profissão nos absorve outra vez, e vamos lentamente encerrando o muro das lamentações, assunto que leva meses, anos, em desparecer, mas pode-se encurtar se choramos, gememos, não nos encerramos e corremos para os nossos deveres sem aceitar nenhuma palavra de apresentação quando tornamos, antes que despois, para os nosso deveres e sumimos o nosso pensar em resolver o irresoluto: o governo de um país.

De certeza a mãe que perde um filho, deve dizer antes de começar a sua semanal grande entrevista: oiça, o que é meu, é só para mim, como a música é dos músicos, os poemas dos escritores, un vestido bem abigarrado que não delate o que só tem valor no nosso coração. Uma volta ao mundo primeiro, ou uma crítica dura para o desgoverno, são o milagre que ajuda a suportar a perca do filho. Como fiz eu, apesar dos quarenta anos passados, de um matrimónio desfeito, o silêncio da casa, essa Ana Karenina que por amor, torna para a vida anterior, guardando na alma essa imensa dor.

Quem sou eu para dizer o que digo? Um admirador de uma mãe que tem o filho a morar dentro dela até a sua eternidade. Sim. A psicanálise ajuda, mas o gemer ajuda mais, e gemer só. Portugal é um país de saudades, façamos dele um país de calma e serenidade, para não perder nunca o arguto pensamento que nos leva a orientar a Grande Entrevista.

Raul Iturra

30 de Junho de 2014.

lautaro@netcabo.pt