Gente morre nos hospitais, a Educação está em pé de guerra, a administração pública carimba como ofensa um aumento de 0,3%, os reformados são aumentados entre 7 e 10 euros.
Mas alguém discute o verdadeiro problema do país que é a estrutural incapacidade da economia crescer, única forma de o país sair da pobreza ? Não por acaso discute-se a Eutanásia.
Ora bem, os mesmos que se calam perante os joguinhos que nos vão mantendo na cauda da UE, estão agora possessos a discutir esse problema que tanto incomoda os portugueses. A Eutanásia.
Já vieram todos à liça. A Ordem dos Médicos, a Igreja Católica e as igrejas de todos os credos, o Presidente da República, o Primeiro Ministro. Uma farturinha. Todos, mas todos têm opinião.
Esconder os verdadeiros problemas do país e do povo atrás de falsos problemas, é um talento mil vezes repetido.
Outro conceito é o de que os profissionais de saúde devem tratar, curar se possível e acompanhar os doentes, nunca matar ou ajudar a morrer. O que faz todo o sentido e deve continuar a ser o seu principal objectivo. Mas só quem está muito mal informado é que não tem conhecimento de inúmeros casos de ajuda, por profissionais de saúde, a doentes perto do fim que querem acelerar a sua morte. Tudo feito às escondidas, à margem da lei, com enormes riscos de denúncia e com consequências profissionais gravíssimas. Não seria muito mais honesto evitar ao máximo, ou mesmo acabar com esta situação?
Admito que pensar desta forma pode parecer aberrante para alguns, mas felizmente já muitos profissionais de saúde pensam o mesmo.
É uma matéria muita difícil porque as margens de discussão são muito fluidas . Entre a vida e a morte há demasiados graus de (in)certeza. Cada um de nós é uma situação própria, o que é aceitável num caso pode ser um terrível erro noutro caso.
Veja-se o que argumenta esta técnica acerca da cada vez maior utilização da Eutanásia nos idosos com doenças mentais o que a levou a demitir-se. A Eutanásia na Holanda é legal a partir dos 15 anos o que leva a situações bizarras como a do adolescente de 16 anos que requereu a Eutanásia por ter sofrido um desgosto de amor.
Pessoalmente inclino-me para a legalização ( liberdade pessoal) mas reconheço que há argumentos de um lado e outro muito razoáveis. Mas há argumentos completamente radicais como a de que não será necessária a avaliação do médico e da família . À primeira depressão os que não têm coragem de se suicidar optam pela Eutanásia.
É preciso avaliar a situação nos quatro países europeus que já legalizaram a Eutanásia e legislar com o máximo cuidado e de forma prudente.
Já na legalização do aborto havia menina cujo argumento era " na minha barriga mando eu". É tão assim que podiam por começar por não engravidar.
Francisco George ex- Director Geral da Saúde diz que nos hospitais privados pode haver médicos que prolongam desnecessariamente a vida dos doentes para assim o hospital facturar mais. Com a mesma lógica podemos dizer que nos hospitais públicos haverá médicos que antecipam a morte para terem mais camas vagas.
Se nos hospitais privados se estica a vida para aumentar a factura a pagar pela família nos hospitais públicos apressa-se desnecessariamente a morte para reduzir a factura ? Não está mal para inicio de conversa
É caso para dizer que o ex-Director-Geral tem uma fraca opinião sobre a classe médica a que pertence.
Mas esta questão Público versus Privado estupidifica toda a discussão em vários sectores da sociedade não é só na saúde. Na Educação fecham-se boas escolas por serem privadas e financiam-se más escolas por serem públicas.
Mas basta olhar o problema pela óptica do doente no caso da Saúde e do aluno no caso da Educação para se perceber que a questão Público/Privada é só uma questão ideológica.
O debate político-social que começa agora a manifestar-se na sociedade portuguesa sobre a morte medicamente assistida, vai seguramente radicalizar posições.
Vão-se dizer imensos disparates políticos, ao sabor de sondagens e de estudos de opinião.
Vão-se dizer imensos disparates técnicos, para disfarçar posições meramente culturais, religiosas ou individuais.
Vão-se dizer imensos disparates jurídicos, pagos a preço de ouro, sustentando, simultaneamente, tudo e o seu contrário.
Diga-se o que se disser: sobre a minha morte, decido eu!
No dia em que sentir que o somatório das alegrias que ainda deixo aos que me rodeiam for inferior ao somatório das mágoas que os faço sentir, é o dia em que eu decido.
E, nesse momento: - Não autorizo qualquer político oportunista a decidir por mim; - Não autorizo qualquer religioso fundamentalista a decidir por mim; - Não autorizo qualquer jurista vendedor de pareceres a decidir por mim; - Não autorizo qualquer técnico, por mais credenciado que seja, a decidir por mim.
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Repito: no dia em que sentir que o somatório das alegrias que ainda deixo aos que me rodeiam for inferior ao somatório das mágoas que os faço sentir, é o dia em que eu decido.
E, nesse dia, não permito que qualquer autoridade impeça a minha dignidade:
- Sobre a minha morte, decido eu!
Carlos Paz
PS : é o direito à liberdade de escolha que nesta matéria como em muitas outras, está em discussão . O resto é tentar limitar a liberdade individual
Médicos e enfermeiras falam na Eutanásia, uns para a negarem outros para confirmarem a sua prática. Ora nenhum profissional da saúde se atreveria a, publicamente, reconhecer que já foi parte integrante da sua prática se não fosse verdade. Até por saber que a maior parte dos seus colegas a negariam. Que razão levaria um profissional de saúde a expor-se publicamente num assunto tão delicado ? Ou é um acto de coragem ou um acto que exige tratamento psiquiátrico.
Pereira Coelho, conhecido como o "pai do bebé proveta", admitiu já ter vivido a situações de morte assistida.
"Posso dizer que já assisti a alguns casos destes na minha vida profissional nos hospitais".
Eu, por mim, não tenho dúvidas e não serei eu a atirar a primeira pedra a quem, corajosamente, lida com decisões tão difíceis. Creio que o país deverá iniciar um amplo e profundo debate sobre o assunto.
Antes de se discutir a Eutanásia é preciso saber o que é, quais as suas formas, e o que existe já em Portugal e nos outros países onde a matéria foi estudada e implementada. Por enquanto, por cá, só temos palpites e a opinião de associações de profissionais de saúde ou de religiões. Necessárias mas que não esgotam o assunto.
A mulher de um amigo meu contou-nos depois. Após um primeiro e único ciclo de tratamentos o cancro não recuou. Eram necessários tratamentos mais intensos. O meu amigo perguntou ao médico quanto tempo ganharia com isso. Obtida a resposta, falou com a família e com os amigos ( telefonou-me a despedir-se, percebi depois) e iniciou a grande viagem umas semanas depois. A morfina ajudou-o a morrer em paz rodeado da família.
O meu pai teve um melanoma ( cancro da pele, o mais agressivo) tendo sido operado. Viveu um mês sem dores e sem evidência de metástases. O maldito apareceu-lhe no esófago com dores intensas. O cirurgião ( do IPO do Porto ) avisou-me que a morte seria muito dolorosa sem outra cirurgia. Era preciso retirar o tumor e reconstruir o esófago. Pedi-lhe para esperarmos algum tempo até que as dores fossem insuportáveis . Eram-lhe aplicadas injecções de morfina até que um dia de manhã, ao acordar, morreu a falar com a minha irmã em cuja casa residia.
A morte, no fim de uma vida intensa com os filhos criados e os netos a crescer não é drama nenhum. Há que olhá-la nos olhos e torná-la o mais suave possível . O Testamento Vital ajuda. É agora necessário que a discussão se faça.
"Administrar uma injeção letal a um doente para lhe tirar a vida é eutanásia ativa, a única forma de eutanásia punida pela lei. Enquanto que administrar uma dose terapêutica para alívio da dor de um doente terminal e replicar essa dose, “mesmo que ela possa provocar a morte”, também é eutanásia ativa, mas não é ilegal. Inês Godinho refere ainda um terceiro tipo de eutanásia, a passiva, que é aquela em que o doente deixa a doença “tomar o seu rumo”, pede que não lhe sejam administrados mais medicamentos ou que lhe sejam desligadas as máquinas. E o médico é obrigado a respeitar. Neste caso também não está a cometer crime."
O Bloco de Esquerda é como os outros à medida que não se pode furtar à discussão e à tomada das decisões. Campeão da transparência democrática está contra o referendo sobre a Eutanásia. Tem medo que o povo (de quem se diz porta voz) se pronuncie. Como cabe na maioria parlamentar com PC e PS agora funciona como todos os outros. Para quê escutar o povo, esse ignaro, que até pode votar mal ? Resolvemos isto aqui entre nós que é democrático.
Aprofundar a democracia já não lhes diz nada. Um dos seus dizia com enfado, numa das televisões, que o assunto se dava a "manipulações" leia-se, não era certo que ganhasse a posição do partido sobre o assunto. E como se trata de assuntos da vida e da morte das pessoas o melhor mesmo é não lhes perguntar nada. Nós, os clarividentes, os que amamos o povo, tratamos-lhe da saúde. Isto é da morte sem dor . Assunto que, obviamente, não interessa aos próprios.
Os comunistas são assim. Tratam da nossa vida, não precisamos de ter opinião sobre nada, eles sabem o que é bom para nós.
É preciso que a população esteja devidamente informada. Ontem a França verteu em forma de Lei o direito dos seus cidadãos morrerem sem dor com sedação profunda mas sem antecipar a morte, que é a chamada eutanásia ou morte assistida. Há pois que não confundir.
Em Portugal a sedação profunda já é possível no quadro mais amplo do Testamento Vital. Qualquer cidadão na posse das suas faculdades ou a família e o seu médico podem decidir "não ser submetido a reanimação cardiorrespiratória, não ser submetido a meios invasivos de suporte artificial de funções vitais e não ser submetido a medidas de alimentação e hidratação artificiais que apenas visem retardar o processo natural de morte são algumas das opções constantes no testamento vital."
Há dois anos um amigo telefonou-me a despedir-se. Morreu na semana seguinte. A mulher contou depois o processo que levou à decisão. Após a operação a um tumor no pescoço e de um primeiro tratamento de químio, o cancro não cedeu. Colocado face a este cenário perguntou ao médico o que se podia esperar se continuasse com o tratamento. Quase nada foi a resposta crua mas pedida. Optou pela sedação terminal. Morreu sem dor e em paz.
Há uma corrente de pensamento médico que afirma que hoje já é possível à medicina evitar a dor até ao desenlace final. Por esta razão a eutanásia é desnecessária. O doente pode morrer com dignidade sem qualquer participação activa do médico e da sua família.
Com a eutanásia o fim pode ser abreviado. Doente, a sua família e o seu médico podem tomar em conjunto essa decisão. É uma decisão difícil mas que no quadro de uma situação terminal equivale a uma libertação. Já todos tivemos familiares e amigos nessa situação e a morte nessas condições não é um drama. Drama é a situação de milhares e milhares de doentes que permanecem "vivos" agarrados a máquinas e a sofrer.