Nós, homens, somos um labirinto de paixões, nem sabemos como nos namoramos, como caímos rendidos aos pés de gente sã, trabalhadora e linda. Não apenas bonita, o adjetivo não corresponde. Linda é não apenas coloquial, é uma verdade que não requer prova. Dez anos mais nova que eu, como dois filhos e um divórcio no meio Os 30 anos da vida jogam-nos brincadeiras em que o coração no descansa, cai outra vez nas redes da uma profunda emotividade e desejo. O meu divórcio era uma realidade que me livrava de ações antes por mim desejadas, mas abandonados por quem eu tinha sido rendido nos meus vinte anos. O amor dos vinte, não é sério, dura un pestanejar, mas dá frutos, esses frutos que hoje em dia me têm feito avô de crianças que adoro. Como adorei a minha descendência e a dela. Foram quinze anos de felicidade que nunca consegui esquecer. Nem hoje, sempre a andar baixo a chuva e o vendaval da tormenta. A felicidade era tão forte, que não reparei como a água entrava entre as nossas roupas. Vivemos dias de sonho, de felicidade na pobre casa que habitávamos em sítios do alto Portugal. A minha vida mudou como a de um anjo e não conseguia estar sem ela. Até salvé a minha vida graças a sua intervenção. Tinha por hábito usar óculos obscuros, que mudaram a transparentes quando reparou que gostava de mim. Não são muitas as palavras que posso proferir. O amor não tem definição, a paixão ainda menos. Paixão que nos levara a mudar as nossas vidas e passamos a ser adultos responsáveis. A paixão é essa atração que nos desfaz a razão na líbido da atração. Não há mais pensamento racional, há uma intimidade permanente que junta as pessoas até o ponto de ficarmos cegos para os outros. A idade passa e não para. Continuamos a crescer se os sentimentos entram em nós e nos agasalham. Estes dias que vivemos em Portugal são duros, mas os sentimentos arrebitam e há um esquecer dessa realidade em torno a nós. Não tenho mais palavras para dizer. Fui muito várias vezes, habituado a relações prévias que nos tinham feito infelices. Más, esta nova relação, mudou a minha vida até o ponto que fui capaz de não ser um homem maldoso. As palavras me faltam. Várias vezes fui um machista que não reparava estar em frente de uma mulher que merecia, respeito, carinho e amor. Talvez o amor à ciência, me fez esquecer o amor às pessoas. Essa é a minha culpa e o que vivo hoje em dia, é resultado da dedicação ao saber e não a pessoa que respeita o homem que a acompanha. Rindo tributo à pessoa, que por amor a mim, passou a ser cientista e peço perdão pela veleidades desmerecidas com que muitas vezes a tratei. Não era uma santa nem o é, mas soube ser uma mulher que me ensinou a ser um homem responsável o que me impede entrar outra vez pelas portas do amor e vivo como um eremita, acompanhado por a memória das duas mulheres que fizeram de mim um ser humano de paixões. O que vivo, o mereço. O lamento. O choro e me faz falta para continuar a vida como pessoa de respeito que aprende a respeitar às outras e os seus sentimentos. Olhos azuis, cabelo louro, mulher de tez branca como a neve, queiras desculpar os maus momentos que te fiz passar e perdoa a um homem que já mais velho, sabe amar. Há problemas na nossa vida social e política que esqueci enquanto andamos juntos baixo a tormenta e os presos políticos que, contigo ao pé, não me interessam mais. Vou ser sempre teu, sem palavras nem reminiscências. A vida muda e devemos seguir esse ritmo. Raul Iturra 26 de Novembro de 20014 lautaro@netcabo.pt
Para o Biscate que foi o meu modelo de escrita. Conhecemo-lo na rua. Magro, nem sujo nem limpo, vestido de forma juvenil como os mais novos de hoje, essa forma que dá o aspeto de andar, a par e passo com os tempos. Na nossa juventude era diferente: andávamos de fato e gravata, penteados com brilhantina, cheios de perfume. Tudo o que as funções familiares podiam permitir, ou as posses económicas facilitavam. Aliás, quanto mais dinheiro entrava em casa, mais exibição das possibilidades do lar. Quanto mais investimento em capital, mais investimento nas pessoas do grupo doméstico: estudo para uma vida futura, profissão, carro para namorar ou passear com os amigos. Quem muito tem, muito exibe. Quem nada tem, é um biscateiro. Neste mundo, dividido em classes sociais, para além das definidas por Karl Marx, existem pelo menos duas no calão português: queque e biscate. Conceitos que abrangem, o primeiro, o ser humano não trabalhador e elegante; o segundo, define quem deve ser um peão de todo o tipo de trabalhos, porque não estudou nem ninguém da sua família se importou com os seus modos de andar, falar, ler, escrever, saber história ou outro tipo de conhecimentos. O biscate vive de trabalho em trabalho, bebe, não se importa com as suas amizades, namora todo o que pode e até tem filhos fora do matrimónio. Tanta é a sua falta de cuidado, que acaba por ser protegido por pessoas que o acarinham e que, por compaixão, acabam por amar o menino abandonado. Foi o que aconteceu connosco. Mal o vimos na rua, reparámos no seu ar sério e composto, na sua elegante forma de ser, a sua beleza em forma física e palavras faladas, que quisemos trazê-lo para casa e investir na sua educação. O que mais chamou a nossa atenção foi a vontade que tinha de viver. Esse esforço para saber e preencher o vazio herdado na sua educação. Não foi fácil. Juntar biscates com os queques que haviam em casa, foi um esforço piramidal. Os primeiros mostravam a vontade de viver, enquanto os nossos deitavam tarde para tarde acordar e, por vezes, se estavam para aí virados, ir à instituição de ensino. Ao levar-mos o biscate para casa, existia a intenção dos nossos aprenderem com a visita. Mas, foi tudo ao contrário. O biscate não abandonou o seu desejo de viver e, no entanto, queria viver também á maneira do queque. Colaborava, é verdade, nas venturas e desventuras do lar, ao ponto de ser um apoio para os mais velhos. No entanto, um certo tipo de apreensão começou a surgir: não conseguia ser queque, pela sua origem de classe. Ainda que hoje estejam facilitados os ingressos nas escolas e noutras instituições como forma de remediar o passado desesperado em trabalhos obrigatórios, o biscate queria ser também um queque e trabalhar para si. Infelizmente, hoje em dia, qualquer trabalho requer o 12º segundo ano. O nosso biscate tinha apenas a 4ª classe. O nosso biscate namorava tantas meninas quanto podia, fez um filho a uma delas e, sabe Deus, a quantas mais. Porque as contas, nestas matérias, estão sempre saldadas, como debato num livro a sair no Chile, brevemente. O problema para o biscate residia no facto, de não ser queque. Sem reparar que ser queque é um pecado capital. Normalmente remediado mais tarde, discretamente, pelas famílias. A luta contra si próprio e a sua cultura causavam-lhe depressões de todo o tamanho, até ao internamento num sítio especial, do qual saiu sarado. A história ainda tem muito para ser contada, mas entre a falta de escola e a falta de lar, seria um livro infindável. O problema poderia ser resolvido, se os pais das crianças que falo, souberem ler entre linhas por forma a organizarem o comportamento dos seus rebentos e despoletar neles essa ânsia terrível de viver que tem o biscate. *Retirado do livro em que trabalho, com o mesmo título.
Raul Iturra 13 de Novembro de 2004 lautaro@netcabo.pt
Nos tempos que correm de violência familiar, é una ideia feliz, parece-me, falar de amor familiar. Foram estas as palavras que escrevi a minha neta britânica: Em breve deves estar comigo, minha querida neta May Malen. Enquanto não chegas, andam todos a correr porque me amam e querem que seja feliz com a tua visita. Quando Friedrich Engels, companheiro de escrita e de luta de Karl Marx, escreveu A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado (1a. Edição: 1884 ; 4a. Edição Revisada: 1892), nunca imaginou o ardente carinho que um pai de família, como eu, pode sentir pela sua neta mais nova, talvez porque não tinha filhos nem netos, e como o elo do texto era a relação entre a propriedade e a família, centrou o seu livro (que pode ser lido em http://classiques.uqac.ca/classiques/Engels_friedrich/Origine_famille/Origine_famille.html) mais na propriedade que devia ser comum para todas as pessoas, como acontecia nas famílias mais antigas da sua época. O autor não fala de emoções ou emotividades, não era necessário, porque partilhar tudo o que se tem ou se possa adquirir dentro do grupo doméstico, é bem emotivo sem dar mais explicações. Os meus leitores devem interrogar-se sobre o que leva o Avô a falar destas temáticas com a sua pequena neta, que nem conhece a língua do texto e ainda menos entende o debate. May, tu vives feliz e tranquila com os teus pais e tudo o que possuem vêm às tuas mãos. Nos tempos de Engels, as famílias estavam muito unidas e defendiam-se de qualquer tipo de ameaça que viesse de fora, como os teus pais fazem contigo. Estão sempre alerta por causa das dores desses teus dentes novos que nunca mais acabam de sair. Como são inteligentes, fazem turnos, como acontecia com a família Punalua, da que falava Engels, para não permitir relações sexuais entre irmãos uterinos, exemplo que servia para definir o Estado, a forma mais perfeita de organização social. Hoje em dia, as famílias vivem à distância, mas têm formas de se encontrar para as festas rituais aniversários, férias... Se a economia do país o permitir. As crises que estamos a atravessar em Portugal, a falta de dinheiro, a falta de investimento, a fuga de capitais, não deixa as pessoas viverem em paz. Tu ainda não percebes, nem os teus pais iriam permitir que tamanha felonia dos chamados mercados financeiros internacionais estão a provocar a Portugal, entrasse pelos teus suaves ouvidos de seda. Mas, já adulta, no futuro, os teus ouvidos de seda vão ouvir isso e muito mais. Por enquanto, esta é mais uma advertência aos adultos que tomam conta de ti e das teorias que deviam saber para tratar de ti. Teoria que o teu avô tem criado (Etnopsicologia da Infância, virada para a cultura ocidental) para pessoas como tu, aprendidas com George Devereux, no Collége de France, em Paris, criador da famosa (para ele) Etnopsiquiaria Indigenista Mohave. Hoje, nada disto entendes, mas a letra fica escrita, não é levada pelo vento e um dia os teus pais vão ensinar-te estas ideias e muitas mais. Amar e ser feliz, é o objectivo da vida, como Engels e Marx praticantes da confissão anglicana. Prática que os levou a compreender que amar e lutar por quem se ama, é o elo final de todo o ser humano… Obrigado, May Malen, por fazeres de mim um homem feliz, como os teus primos neerlandeses fazem contigo e com todos os adultos que tomam conta de vós. Não esqueças a Família Punalua e o Estado que toma conta de nós… Do teu Avô ou Abuelo ou, ainda, Lelo o Pío-Pío Raúl 11-11-2014 lautaro@netcabo.pt
Os dias que vivemos são tristes e de miséria. Pensemos melhor nas relações emotivas e simpáticas que juntam seres humanos. Escrever sobre um sentimento, não precisa citações. A amizade é uma afeição recíproca entre duas pessoas que cultivam boas relações. É a sinceridade entre essas duas pessoas que sabem partilhar sentimentos e calar. Numa palavra, é a confiança mútua entre pessoas de qualquer idade que sabem tomar conta uma da outra, sem entrar pela vida privada do outro. É um sentimento de nunca abandonar a pessoa por quem se sente afectividade. Foi, na Grécia clássica que, pela primeira vez, através de Aristóteles, definido o conceito amizade. Os motivos da Amizade diferem em espécie, como, também, diferem as respectivas formas de afeição e de amizade. Existem três espécies de Amizade, e igual número de motivação do afecto, pois na esfera de cada espécie deve haver afeição mutuamente reconhecida. Aqueles que têm Amizade desejam o bem do amigo de acordo com o motivo da sua amizade: 1) Utilidade: a Amizade existe na medida em que se recebe um bem de outra pessoa. Incluindo, esta categoria, o prazer: isto é, desenvolve-se a Amizade por pessoas de fácil graciosidade, não em virtude do seu carácter, mas porque elas lhes são agradáveis. Assim, aquele cujo motivo da Amizade é a utilidade ama os seus amigos pelo que é bom para si mesmo; aquele cujo motivo é o prazer fá-lo pelo que lhe é prazenteiro; nunca o é em função daquilo que é a pessoa estimada, mas na medida em que ela lhe é útil ou agradável. Essas Amizades são portanto circunstanciais. A fonte desta ideia é o livro Ética a Nicômaco de 333 antes da nossa era, versão francesa de 1992, Presses Pocket, Paris. Texto que define não apenas uma intimidade entre duas pessoas, bem como o interesse ou o despertar da simpatia de outra pessoa em nós, ou de nós em outra pessoa (atitude recíproca), relação nunca abandonada, onde nada se espera há excepção da mútua confiança. Para falar de amizade muitas palavras há para serem usadas, é todo um tratado como os dos filósofos ou o interessante livro de Marguerite Yourcenar: O tempo, esse grande escultor, 1994 (1ª edição), 2006 (2ª edição), publicado pela Difel, Paris e Lisboa, que defende a ideia que serve de entrada a este corto texto. O que mais esperamos da amizade é a companhia, a simpatia, o não abandono, o sermos precisados e visitados pela pessoa ou pessoas em quem depositamos confiança, sem erotismo no meio. É o que eu espero dos outros: a solidão nada esculpa, nada entrega. É o tempo que nos oferece a emotividade da afeição. Como (quase) todos os meus denominados amigos que, foram esculpidos durante um tempo, até se lhes acabar a necessidade, entregando, agora, a sua confiança a outros mais necessários para os seus objectivos. É o neo-liberalismo destes dias que não entende de sentimentos, mas de lucro. Nicômaco recebeu uma grande mostra de amizade com o livro de Aristóteles: era o pai do filósofo...
O Luís agrupava os seus amigos entre os ocasionais (jogos de futebol ou de poker, idas à praia…) e os constantes (visitavam-se regularmente, promoviam jantares, encontros, tertúlias, iam ao cinema…, numa palavra, apoiavam-se). Mas, numa ou noutra situação, o que era comum no Luís era a curiosidade sobre tudo o que o rodeava, provocando-lhe uma vivacidade, rapidez e perspicácia de pensamento e um sentido de humor incomuns. Com ele tudo se debatia, tudo estava em permanente discussão, em permanente interrogação, no seu universo não havia verdades feitas, por isso era um jovem intelectualmente estimulante, para quem o rodeava. Raul Iturra 6 de Novembro de 2014. lautaro@netcabo.pt
Se actualmente é difícil falar em crianças, a abordagem à temática fica mais complicada quando temos limitações do número de palavras. Mas, vamos a isso. Dentro das várias definições de infância e criança usadas nos meus textos, há duas que me satisfazem. Criança, é um ser humano no início do seu desenvolvimento fisiológico e social que depende dos seus adultos na alimentação, nos sentimentos, no carinho, no vocabulário e no abrir da sua imaginação para entender como se desenvolve o mundo. Adultos que podem ser os pais, os tutores ou um conselho de família. Infância é a pessoa que nasce, cresce, aprende a vida intra social. Na cronologia da vida, essa criança passa a etapa da infância. Conceito que transcorre, idealmente, desde a nascença até à idade púbere, idade em que o indivíduo se torna fisiologicamente apto para a procriação de outros seres humanos. Atenção, referi reprodução fisiológica. Será que é adequado ter cromossomas só para reproduzir seres humanos? Em todos os meus textos tenho dito que isso não é suficiente. Aliás, a própria História assim parece provar. Uma palavra cheia de distinções na cronologia do tempo e conforme seja a hierarquia social. Criança, em consequência, não é um conceito biológico, é muito mais, é um conceito social. Motivo pelo qual o meu amigo e colega na cátedra do Collège de France em Paris, Pierre Bourdieu, o sábio dos sábios em ciências do homem, nunca quiseram estudar o pré púbere, como poucos de nós tem feito. Os cientistas, excepto os analistas clínicos, têm experimentado evitar a análise da infância. Muitos cientistas, envolvem a criança dentro das relações sociais, centrando, no entanto, os seus estudos nas relações. Poucos Antropólogos começam a análise social a partir dos mais novos. Normalmente, estudam instituições, como a família ou os amigos, ou seja as interacções sociais. Maurice Godelier em 1981, editou um livro pela Fayard, La Reproduction des Grandes Hommes para analisar a passagem de criança a adulto, como David Herdt em 1987, entre os Sambia da Nova Guiné, ou eu próprio, entre os Picunche, clã da Nação Mapuche que habita na área Sul da Cordilheira dos Andes. Assistir à passagem de criança para a infância, é duro. Envolve elementos sexuais para provar, ao mais novo, que um dia terá esperma para multiplicar os membros da população. Para tal, é preciso observar as relações eróticas entre um púbere e uma criança, que oferece o seu esperma, antes de casar com a irmã do iniciado. O ritual denomina-se fellatio, e quem é alimentado pelo púbere é quem ainda não entrou numa mulher, permanece com a criança até ser adulto, por outras palavras, até que ele próprio produza sémen. Ritual praticado entre os Baruya, os Sambia e os Picunche. Quando apresentei o meu livro do ano 2000: O saber sexual das crianças. Desejo-te porque te amo, Afrontamento, Porto, o auditório ficou escandalizado. Devo confessar que eu também, ao viver na casa dos homens entre os Picunche e observar o que observei. A prova final é uma masturbação colectiva entre as já não crianças, mas infantes, acompanhados pelo rapaz que lhes deu o seu sémen, que, acabado o ritual, casa com a irmã do seu iniciado, à qual acede apenas para engendrar filhos, continuando a morar na casa dos homens tendo o seu iniciador como companheiro. Não é homossexualidade, é um rito de passagem que, entre nós, também se pratica, não como cerimónia, mas como felonia, ao correr dinheiro entre a criança e, neste caso, o seu violador. É apenas pensar no caso da casa Pia. A criança, passa a adulto, a seguir à fellatio ritual. Entre nós, depois de namorar uma rapariga que é a nossa companheira, mesmo que o seja pela via do aparecimento de filhos. Falar de criança e a sua passagem ritual a adulto, é, por vezes, difícil de relatar sem ofender… Raul Iturra 1 de Novembro de 2014. lautaro@netcabo.pt
PARA ELISA Essa minha nova neta, que acabou por se chamar May Malen….
Os leitores queiram desculpar, mas volto a falar de netos, como há tempos no artigo que dediquei ao meu amigo fraterno, Daniel Sampaio. O motivo é simples, a vida é um eterno retorno. Não um retorno de uma almai que vai embora e torna a aparecer noutro corpo, como acreditam muitas pessoas, especialmente os Kiriwina da Nova Guinéii. Para os que acreditam em almas, é evidente. Não tenho essa sorte, pelo que sempre os meus descendentes estão perto de nós, podendo, assim, como diz o meu sábio amigo, dedicarmos-lhes um dia, pelo menos, da semana, para sermos avós a sério. Não é o caso de Elisa, irmã de Ben, que estará connosco em breve. Nascida britânica. Mas Elisa, é, também, a melhor sonata de Ludwig van Beethoven W 0 O 59, escrita para a mulher que amava, Elisaiii ou Für Elise. Essa rapariga que já é amada, cuidada e tratada com todo o carinho pelos seus pais e avós, todos nós, antes mesmo do seu nascimento. É dito que comemorar antes do tempo da nascença, dá azar. Será para os que têm espírito de fé, mas não para os que amamos desde o primeiro dia em que os quatro avós e um bisavô ficaram a saber que ia nascer, que devia nascer, uma outra pessoa descendente que nos perpetuará. Será de olhos azuis como o seu pai. De pele branca transparente, como a sua mãe. De paciência e devoção ilimitada para os outros seres humanos, como esses quatro avós. É já uma festa. Quando temos descendentes, nós, avós, respeitamos a criança e os seus afazeres. Enquanto está no seio da mãe, simultaneamente o pai toma das duas (mãe e filha), com amor e dedicação. O seu título será de Baronesa, pela sua formosura e qualidade de vida, aprendida de seus pais e de outros ascendentes, quatro gerações ainda vivas e em actividade. É, deve ser, uma rapariga em lá menor. Essa nota que dá a melodia e o cuidado do som e alegria à família toda. Já está comigo Für Elise, à sua espera, enquanto, como em todos os sítios do mundo, nós os avós, respeitamos, amamos e até adoramos apenas a ideia de outro estar a chegar. Beethoven devia ressuscitar para mudar o nome da peça de bagatela, para variações e fugas dos seus amantes pais. Para Elisa, agora May Malen, é um prazer já, porque existe e é mimada. Com amor a esses pais que vivem uma das fases mais alegre da vida.
Recentemente têm começado a aparecer, de forma mais notória e sobressalente, o abandono que fazem os pais dos seus filhos, sem nenhum cuidado pelos mais novos. Dias antes, escrevi o texto violência e crime intrafamiliar, acessível em http://bandalargablogue.blogs.sapo.pt/violencia-ou-criminalidade-1091182 . Mas, revoltei-me ao saber que um antigo Ministro de Ciência e uma apresentadora da TV, apenas podem-se encontrar para se entregar os filhos que têm passado dias com eles, si a polícia está presente: tanta é agressividade entre este desfeito casal, que passam a ser o pior exemplo para os pequenos filhos, um hoje qua augura um futuro infeliz para o dia em que os pequenos passem a ser adultos. Ou a rapariga que salvara de um incêndio a seis irmãos dos oito que tinha, e entrou de novo por não estar certa se os outros dois dormiam no lar o em casas de avós. Era hábito nesses jovens pais abandonar os filhos de noite e sair a se divertir como pais sem filhos. Ela morreu na tentativa nos seus dezasseis anos. Amadora toda ficou revoltada e uma linha telefónica especial, o 24, tem sido aberta para filhos abandonados. Como é natural, as crianças sobreviventes não foram devolvidas, vivem com parentes e os pais, foram a cadeia e tribunal. É a família de hoje.
Sonhemos. Tornemos ao que entendemos por família: é um substantivo quase impossível de definir. Talvez se possa dizer que é um conceito que tem várias definições, todas elas certas por corresponderem a diferentes maneiras das pessoas se vincular. Pela negativa, é mais simples falar de família às pessoas que não têm parentesco entre si, quer dizer relações consanguíneas ou por afinidade. Se a relação é consanguínea, a definição é mais simples: automaticamente pensa-se no pequeno grupo de pai, mãe e descendentes (filhos). Nos tempos da minha juventude, era um grupo que incluía irmãos dos pais, os seus filhos, ou os meus primos, pela primazia da relação entre essas pessoas, todas as filhas ou filhos de irmãos/ãs dos pais. Se ainda eram vivos, os pais dos pais ou avôs, eram não apenas família, bem como eram parte do grupo familiar extenso. Viviam todos na mesma casa, baixo o mesmo teto. Há as teorias da família, definidas especialmente no direito romano, no direito canónico ou no direito positivo do código civil. Os três tipos de lei imperavam e mandavam a proximidade das pessoas parentes entre si. O primeiro grupo que tenho mencionado, nasce da economia do capital que pode ter a família alargada que moram juntos num paço, ou num bairro vedado ao público, condomínio de todos os familiares com várias casas divididas entre os grupos domésticos familiares, todos com porta aberta e com circulação dos familiares entre os diversos lares. O meu melhor exemplo, retirado não da teoria que legisla e orienta as relações dos parentes, o que aprendi em trabalho de campo ou método etnográfico. Método que narra e é interpretado pela etnologia ou ciência do entendimento da comparação etnográfica. A imagem que seleccionei para ilustrar este texto descreve o que normalmente se pensa de uma família: grupo pequeno, novo e com bebés. Tal como Norma refere a Druida, que vê os seus filhos assassinados, a destruição do hábito de viverem juntos e da casa queimada pelos invasores que lhe destroem a família. A ideia está baseada numa lenda francesa defensora da família. O segundo exemplo que pensei referir, é o de meu amigo Hermínio Medela de Vilatuxe, descendente dos duques de Alba e primo dos Condes de Lemos na Galiza, factos que ele próprio desconhecia e que acabei por desvendar durante a minha pesquisa de etnopsicologia da infância, com três visitas prolongadas de dois anos, e outra de sete meses em casa deles. A lei gálica dá a herança ao primeiro filho(a) nascido(a), o que coube à sua irmã Marcelina, a Patrúcia da família, os descendentes sem herança, tinham de abandonar a casa. Quando adulto, Hermínio era pastor de cabras por isso emigrou. Com as poupanças e a colaboração da sua mulher Esperanza, que se empregava como doméstica em casas ricas, enquanto as crianças eram cuidadas pelos avôs maternos e paternos, regressou a Vilatuxe, onde construiu uma casa para a família. Mas a família cresce, à casa são acrescidos novos quartos até que o meu compadre abuelo, pondo de lado a lei, decidiu dividir a sua quinta, adquirida com dinheiro da emigração e da sua pastorícia de cabras, a sua profissão, para a repartir de igual forma entre os seus descendentes. Filho(a) que casa, recebe então parte das terras e entre essa inúmera família construem-se novas casas para os casados ai viverem e ganharem a vida no que melhor puderam. Ao todo, cinco casas são levantadas, contando a casa paterna, entregue ao mais novo Medela, o meu amigo Miguel e à sua mulher Catarina. História narrada e analisada nos meus livros sobre Vilatuxe, especialmente no editado pela Profedições: O Crescimento das crianças, Porto, 1998. Era uma família de condomínio, muito chegados uns aos outros e com uma profunda solidariedade e respeito aos pais, Hermínio e Esperanza, como analiso no meu livro de 2010: Esperanza, uma história de vida, publicada em Estrolabio pelo meu amigo editor Carlos Loures, Lisboa. Teoricamente, família é definida como o conjunto de todos os parentes de uma pessoa, e, principalmente, dos que moram com ela. Conjunto formado pelos pais e pelos filhos, ou conjunto formado por duas pessoas ligadas pelo casamento e pelos seus eventuais descendentes, bem como é um conjunto de pessoas que têm um ancestral comum, ou que vivem na mesma casa. Família, enfim, são pessoas unidas por consanguinidade ou por laços de afinidade, resultantes de matrimónios de pessoas de fora da família conjugal, que casam entre si e geram uma descendência que passa a ser consanguínea da pessoa e dos seus parentes, que incorporou por matrimónio mais um membro dentro da família. Passam a ser de parentesco duplo: consanguíneos e afins. Ou que não casam e aparece uma terceira forma de família: amancebamento, legislado pelo Código Civil. A família tem a sua nota em dó maior com os netos, como a que hoje espero: May Malen I. Ilsley, que amo profundamente, como à senhora que me acompanha na vida, fémea que fixou este texto e tem feito da sua família um sítio em que se acompanham e se fecham entre eles. Como a minha. A dela não cabe na minha e vice-versa, pelo que a relação é longínqua, mas há confiança e comunicação- co eantigamente. Isso e família. Raul Iturra 25 de Outubro de 2014 lautaro@netcabo.pt
http://youtu.be/n0XTnmr9rxo Wagner Tanhaüser. Coro dos peregrinos http://www.youtube.com/watch?v=n0XTnmr9rxo&feature=youtu.be&t=2mhttp://youtu.be/n0XTnmr9rxo%3ft=1m17s47s Ligação http://www.youtube.com/watch?v=n0XTnmr9rxo&t=4m6s para o vídeo
Foi uma surpresa. Sabíamos que vinha, mas nunca tão cedo, o nosso weñe Javier ou Javier Weñe. Nasceu as 13 ppm da quinta-feira dum espirro da mãe! Não é simples nem difícil. Falar de netos e referir uma geração que substitui a outra. Em anos curtos, ou ao longo de mais da uma década. Há factores heterogéneos, diversos, que permitem que três gerações sejam capazes de partilhar a sua vida dentro do mesmo universo. Parece-me que a mais elementar é a cronologia das idades dos progenitores da geração mais antiga. Se a paixão, o namoro, a sedução começam a uma idade temprana, pode acontecer que essas três ou quatro gerações partilhem o mundo durante um tempo cumprido. Se o convívio sedutor começa tarde, o mais provável é que a vida em conjunto seja mais corto que o que desejarmos. O leitor pode entender que falo de pessoas que se amam, respeitam e convivem em paz e serenidade, colaboram nos afazeres da vida e aceitam sem ironia as opções que a geração seguinte opta por realizar. Alternativas afirmativas, enfim, que inspiram reverência, não por causa do seu conteúdo, mas porque a geração mais nova adota como ícone ao adulto que mais o orienta dentro das suas opções. Ser neto não é emotividade, é entendimento, é racionalidade, é seguir com respeito as ideias consultadas a pessoa que sabe entender a via da alma e as suas heterogeneidades. Parece-me que a emotividade pode nascer do agir imitativo de quem não sabe ser orientador dos mais novos e comportar-se com respeito e sedução. Pode-se pensar que ser avo é complexo por sentir um dever esse orientar. Mas o comportamento e a conduta sábia e calada, exprimida apenas de o agir que não fala, apenas faz, acaba por fazer da tarefa de ser neto, um fugir de carícias e uma reprodução do que se vê é feito e, por imitação, aprende que ser neto não são carícias e seduções, apenas conversas sobre os acontecimentos. Entre nós, as carícias são as formas normais de se contactar. Grande engano. Faz 28 horas tive um novo neto. Nem desejo correr, desejo respeitar a geração paterna que dirá o dia e hora para or e o conhecer. Ser neto é todo um trabalho que deve ser respeitado: é um agir esperado e respeitado, diferente de ser filho o irmão. É ser o descendente de um adulto maior, as vezes chamados velhos, que brincam com o bebé e vice-versa. Ser neto é o respeito mútuo entre gerações. Como acontece no quebra-nozes de Tchaikovsky: http://www.youtube.com/watch?v=HMlqaXxY6MQ , ligação http://youtu.be/HMlqaXxY6MQ , na dança da fada açudada. Ser neto um grande trabalho…É necessário entender as ideias do adulto e as suas pretensões, o que nem sempre e possível. O adulto tem um código de vida que o mais novo não entende por falta de conceitos. Aliás, é a vida social que possui esse código que adulto organiza e cumpre, sendo o seu dever transferi-lo para o mais pequeno. A criança neta tem que aprender esse código se quer permanecer dentro da vida social. Parte de esse código, é o de entender o mais novo e o ensinar como o adulto ensina o filho mais velho. Ser neto é aceitar as grandes caricias do mais velho, sejam estes pais, tios, avós ou bisavós. Os mais novos ensejam a liberdade que o seu imaginário lhe ensina. O mais duro, é esses adultos dos que falava ontem que punem os pequenos se não fazem como eles determinam que a vida entre outros deve ser levada. Entre o imaginário e a regra de comportamento, se debate o imaginário da criança, como analisei no meu livro de 1988, segunda edição do ano 2000: O imaginário das crianças. Os silêncios da cultura oral, Fim de Século, Lisboa. Porque silêncios da cultura oral? Porque o neto se divide em dois ou tres, imagina visitas e diálogos, imensas vezes interrompidas por un adulto que pergunta: o que andas a fazes tu? A questão é difícil de responder, nem ele sabe o que faz, dividido como está entre os seus fantasmas, como diria Cyrulnick, especialmente quando define resiliência no seu texto O murmúrio dos fantasmas, editora Martin Fontes, 2005, Paris. Essa pergunta o torna a terra e o imaginário se esgota porque tem que pensar e perante a razão, acaba esse imaginário, fundamental para os pequenos criar um mundo próprio, em que todo entende por a racionalidade da historia que cria, está retirada dos seres que fabrica, imitando adultos. É assim que os adultos aprendem desde a época de terem sido crianças respeitadas pelos seus adultos que calam as sua historias para dentro do grupo familiar, sem nunca troçar com o imaginário. Bem ao contrário, ouvem as fantasias e as calam como cumplicidade entre pais e filho e, eventualmente, um tio o avô.
Raúl Iturra Original de 21 de Agosto de 2011. Reescrito e mudado o sentido, a 21 de Outubro de 2014. lautaro@netcabo.pt
Violência intra-familiar não é um tema fácil de abordar. Pensa-se sempre que um grupo de parentes ou seres humanos relacionados entre si, por laços de consanguinidade ou de afinidade, é um grupo feliz. No seio do grupo, cabe aos adultos protegerem os mais novos orientando-os desde muito cedo na vida, pelas sendas do amor, o respeito filial ou o respeito que os pais têm pelos filhos. Pelo menos, é assim que eu penso. Mas a realidade parece ser outra. Não foi por acaso que coloquei a imagem de uma criança punida, com as marcas de uma bofetada recebida na sua pequena cara. Bofetada de quem se desconhece a autoria e o motivo da punição material, reflectida na cara triste e sofrente de quem não entende qual o mal que fez para receber tamanho castigo. Castigo reiterado ao longo do tempo pela pequena da imagem, e por muitas outras mais. Essa bofetada marca pelo menos três aspectos da vida da infância. A primeira é visível e não precisa ser comentada, a imagem fala o que as palavras da pequena não sabem dizer porque as desconhece ou, ainda, porque não espera que o seu adulto a use contra ela. Essa bofetada pode ser o resultado de quem tem raiva contra si próprio e desabafa nos mais pequenos, como comenta Sigmund Freud em 1905 em húngaro, traduzido para inglês por Hoggart Press, Londres, em Obras Completas, Volume VII,1953: Three essays on Sexuality, ou Melanie Klein em: Inveja e Gratidão (1943 em alemão, 1954 em inglês e em luso brasileiro, 1991), Imago, Brasil, Alice Miller (1981 em alemão), 1998: Thou Shalt not be aware. Societie’s Betrayal of te Child, Pluto Press, EUA, ou Françoise Dolto, 1971: L’Évangile au risque de la psychanalise, Editons du Seuil, Paris, textos que comento no meu livro: O saber das crianças e a psicanálise da sua sexualidade Repositório ISCTE e Internacional, em: http://repositorio.iscte.pt/, ou http://www.rcaap.pt. Textos todos que defendem a criança das ameaças dos seus adultos, que esperam delas comportamentos formais, gentis e de uma responsabilidade mais além dos seus curtos anos. Este tipo de violência, é, para mim, um crime não apenas contra o seu corpo, como contra os seus sentimentos. Sentimentos que devem converter essa criança em adulto triste, deprimido e pouco feliz com a vida. E o círculo continuará a ser repetido por ter aprendido em tenra idade que os pequenos devem ser ensinados às chicotadas e sem nenhum respeito por tudo o que lhe falta saber. Bem sabemos que a lei protege a infância com leis especiais, veja-se, para o caso português, a Lei da Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, Nº 147 de 1999. Até esse dia, apenas o Código Civil imperava, falando unicamente de filiação, heranças e tutorias nos artigos 1776 e seguintes, ignorando absolutamente essa realidade de trair a infância, como se na sociedade nada acontecesse em relação às punições mencionadas. Este pequeníssimo ensaio, é apenas um rascunho do livro que preparo sobre a criminalidade intra-familiar, que é, de forma ignorante, denominada violência doméstica. Nem sempre acontece entre as famílias, mas há mais maus tratos de palavra ou de obra, do que o que a lei quer reconhecer. Andreia Sanches, diz no jornal «O Público» de 16 de Julho: 26 das 41 famílias analisadas com menores maltratados não tinham mais de quatro elementos. "A configuração das famílias é cada vez mais reduzida, há mais monoparentalidade, pode estar a haver uma degradação das condições económicas nestas famílias." No entanto, a imagem é sempre esta:
Para o seu bloguista Ricardo Santos, com prazer e em memória do sempre vivo José Paulo Serralheiro, tal como esse outro que não me esperou, Paulo Freire, o meu íntimo fraterno amigo.
Educar não é difícil. Com um pouco de paciência, nós, docentes de qualquer grau, dizemos, reiteramos, tornamos a reiterar o já explicado. Procuramos alternativas, especialmente para as denominadas Ciências Duras, que de duras apenas têm o nome e a eventual falta de memória. Não pode ser dura uma ciência que tem fórmulas, algarismos, teoremas, geometria. Por outras palavras, um mapa que orienta o pensamento. Nunca abandonei o debate com o meu amigo e salvador da minha vida, José Mariano Gago, que acaba por entende as ciências sociais por motivos familiares. Livro que lhe ofereço, livro que não lê: não tem um mapa de estrada para andar pelos labirintos do que é pensar no ar. As ciências duras, são essas que, eventualmente, obrigam a usar estatísticas, facto que não devia acontecer na Antropologia, Sociologia, Filosofia, História. Ciências de factos, de dados que se aprendem, enquanto se entende, através do que eu designo de mente cultural, conceito criado e provado por mim nos anos 90 do Século XX. Mente cultural resultante das formas de agir, dos costumes, da história oral, do imaginário que tem uma prova: a economia. Quem sabe economia, mas a economia do povo que calcula em tempos de crise, ao fim do mês há um ordenado à espera: baixo e pouco, não a doutoral que vivemos na academia e não corre perigo. Educar não é difícil. Difícil e muito complexo é saber educar. É preciso encantar a criança como as fadas madrinhas e os Peter Pan, para seduzir a sua atenção, sentar-se não no banco do professor, mas andar quilómetros entre eles, olhar nos olhos, saber brincar no meio de uma frase de forma amável e carinhosa para tornar outra vez à frase cortada por causa da brincadeira. Isso é reiterar, com comentários simpáticos sobre a família, gastar dez minutos para comparar Dom Sebastião com as almas em pena, dizer que a República é do povo, pelo povo e para o povo, enquanto a monarquia é para as famílias que tudo têm e nem precisam aprender. Por acaso, tive como discente um filho de Isabel Windsor II do Reino Unido e do seu marido o nosso Reitor, Filipe Mountbatten, que estudou comigo ciência política, bem como ensinei o seu primo Constantino Saxo-Coburgo, da Grécia, meu colega de Faculdade e de sala de estar e de almoço que aprendeu comigo trabalho de campo para conhecer o povo. Tarde demais, tinha sido substituído pelos coronéis gregos que colocaram o PASOK-Partido Socialista Grego- no poder. Saber ensinar estes descendentes de famílias com posse de bens e força de trabalho e larga genealogia, pode parecer um problema se nos lembrarmos dos seus outros trabalhos: Rainha, Príncipe Consorte, Monarca, Conde de Wessex. Eles têm apenas um problema: saber governar ou não. Não sabiam e procuraram na universidade na que eu ensinava, um saber que se retira da prática e de leituras persistentes e ensaios e teses sobre a polis como o Mestre Aristotéis definia e ensinava. O nosso povo tem outro problema, além de possuir apenas força de trabalho, obedecer os seus patrões que eram patronos, como em qualquer outro sítio do mundo: trabalhar para estudar de noite. Os Mountbatten, o Azevedo, os Saxo-Coburgo-Gota, os Espírito Santo, os Hohenzollern, nomeados antes, os Leite, os Vasconcelos, os Porta, os Espírito Santo, os Azevedo, os Bragança, custa-lhes estudar. Importam-se mais com a gestão dos seus bens que da ciência. Mas, quem lhes ensina, podem-se ver dentro de uma salada russa: estão a domesticar um poder soberano, que deve, é e será do povo. Apenas se esquecem e não sabem, que as dificuldades de aprendizagem dos descosidos portugueses nascem do facto de terem que encher a barriga antes da cabeça. Quando a cabeça fica cheia é com letras e livros que não alimentam nem têm mapas para indicar o caminho das letras. Saber ensinar é transferir a história quotidiana de trabalho, dar dicas como tornar mais leves essas horas desde as sete de manhã até as cinco da tarde, com meia hora para comer um prato de sopa e beber uma cerveja. Desde a mais tenra puberdade. Saber ensinar é conhecer as relações familiares, de amigos e vizinhos para desenhar um conjunto de conceitos que não aparecem nos livros, ficando-se apto para enveredar pela perca do medo da vida e da submissão dos acima nomeados. Para saber ensinar, o docente deve conhecer primeiro a vida do bairro da escola ou liceu e traduzir os livros Mountbatten, Bragança, para os Coelho, Pires, Pimentel, Redondo e fazer deles cidadãos de bem. Não por respeito à Constituição, mas por respeito a si próprio e à família. Como esse David Machado que criou os seus irmãos, cozinhando para eles sopa de cabaço e batatas, sendo hoje em dia, um excelente pai de família que transmite aos seus filhos a mente cultural, como bom policia que é. Saber ensinar é nunca dizer pega no livro e vai para o teu quarto. O que o David aprendeu comigo. A herança do que eu denomino ensino – aprendizagem é apenas a educação cívica e que nós saibamos que os resultados são da nossa parte e não de um país fatimizado, como é o nosso. Herança que faz do descosido um bom cidadão, sem pretensões, sem guardar dinheiro que se investe se beber os poucos cêntimos e nunca, mas nunca, pedir aos docentes que punam os filhos porque a letra com sangue entra na Herança dos ministros com nomes gregos que procuram apoio entre os que não sabem que reuniões a fio e relatórios quotidianos, vão lentamente matando os que devem estar sempre frescos para transferir o saber. A herança que deixa o nosso governo atual é para os Vasconcelos, Mounbatten, Espírito Santo e não para o povo que é o proprietário da soberania que apenas a delega entre os que não sabem que em escolas frias e distantes, as crianças fogem. Não do saber, mas sim da miséria em que hoje estamos, herdada desde que um português governa a União Europeia e uma engenheira pretende ensinar a ensinar. Sou português, amo o meu país, dou aulas na rua ou no mercado, para ver a matéria viva que transfiro e experimento fugir dos fatimizados ou que eles fujam das ideias portuguesas dos irmãos Grimm. Dos Judas Iscariotes. Como os Saxo Coburgo tiveram de fazer porque o povo apoderou-se da sua soberania em repúblicas e votos diretos ou sufrágio universal. Ainda assim, em professores, escolas ou livros, sem começar a sua aprendizagem dois meses após da abertura do ano leitivo, o que os Saxo Coburgo nunca sofreram: pagavam os seus docentes privados com bom dinheiro e governavam. O povo é representado um governo e para não acordar os seus apetites, começam tarde, sem docentes ou escolas por perto; trata-se que não saibam da existência do Estado Social….que a canalha faça como entenda, enquanto os Passos Coelhos, Cratos, Portas, usufruem da mais esmerada educação. O governo nem sabe nem quer saber ensinar…
Raúl Iturra Catedrático de Enopsicologia do ISCTE-IUL Membro Activo de Amnistia Internacional, de Human Rights Watch e do Projecto de Alice Miller sobre a Criança Natural. Escritor da Sociedade Portuguesa de autores, SPA, Lisboa, Unesco Paris, CUP, Cambridge, etc. Escrito em 9 do 9 de 2009 Revisto a atualizado a 18 de outubro de 2014. lautaro@netcabo.pt