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BandaLarga

as autoestradas da informação

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MODELO SOBRE O CONCEITO DE TRABALHO HUMANO.

FISIOCRACIA OU AGRICULTURA VERSUS INDÚSTRIA

 

 

Trabalho humano é um conceito que define aticidade, ação. Tenho mudado o título de esse conceito ativo, para um conceito mais estático no tempo. Parece-me que devemos continuar a entender o fundo do porque temos sufragado recentemente.
 A primeira ideia é esse facto de criar um conceito sobre o trabalho humano, ou pensar o trabalho humano e classifica-lo. Essa atividade intelectual ou pensamento dedutivo, como denominava John Stuart Mill1, é um facto que acontece apenas uma vez na conjuntura histórica dos que trabalham de maneira que eu denomino erudita. A seguir desenvolve-se esse conceito em atividades autónomas e individuais, mas em coordenação com os outros membros do grupo social, dentro de uma hierarquia de saberes e capacidades de manipular tecnologias e recursos naturais para os transformar em mercadorias. É esta a segunda questão que é preciso pensar para entender o mais valioso do saber social, o da economia; valioso, mas muito bem guardado como segredo para não enriquecerem todos e assim ter pessoas para produzir e trabalhar para outros. Cria também atividades paralelas como os sindicatos, a diferença entre patrões e operários, o investimento, o lucro, a poupança, a divisão social do trabalho, moeda, a repartição das tarefas humanas e operarias dentro de um mesmo grupo doméstico, em fim, o que tenho vindo a definir ao longo destas páginas. Especialmente, o que Montchrestien diz na sua obra citada2: Há Artes Mecânicas, há Comercio, há Navegação, atividades, todas elas, que estão a florescer e o Príncipe deve de se interessar pelas mesmas para entesourar e fazer dos pobres do Reino, trabalhadores. Montchrestien está a lidar com uma forma nova de trabalho, que aparece a seguir a universalização do comércio: a manufatura ou mecânica e a navegação, duas atividades que são novas para a lógica dos governantes e governados: L’assurance des Peuples nous assure qu’à vous particulièrement, Madame, est destinée la cure des maladies de cest Es. Laborieuse certes, mais également glorieuse. Trois choses principalement vous convient à l’entreprendre. La bonté de votre naturel...La disposition que les François apportent à l’obéissance de vos commandements...Et l’assistance des plus habiles...3 Todo o trabalho de Montchrestien está relacionado, ou diz respeito, às formas noves que aparecem dentro de economia, até o ponto de denominar ao seu texto Tratado de Economia, que apenas Aristóteles havia usado faz séculos antes, como tenho invocado antes. Mas, a Economia do citado autor francês, do Século XVII, nada tem a ver com a Economia do tratado de Aristóteles4. Este grego tinha definido que o lar era prévio à atividade pública, já que a cidade está composta de diferentes lares, e cada lar é um património composto por um conjunto de pessoas de diversa hierarquia e de bens ligados a elas: “Il n’ya pas seulement [différence] entre l’Économique et la Politique autant de différence qu’il ya a entre la famille el l’État (cara tels  sont bien les objets respectifs de ces dex disciplines), mais encore celle ci: la Politique est l’affaire de beaucoup des chefs, et l’Économique dún seul.”5 . (não são gralhas, soão palavras en francês do século XVII, 1615, para ser mais preciso. O parágrafo anterior o tenho passado a francês moderno, mas este fica como está no texto original)
 A problemática que Aristóteles tenta definir, é de como, apesar de haver um governo para os diversos lares ou cidadãos desses lares ou pessoas com direito a voto, como já temos definido antes, existe um canto mais importante ainda que deve ser cuidado com provisão de bens e atividades para poder sobreviver e viver bem. Aristóteles não em vão, define a Economia como a arte do lar de gerir os bens que este precisa para viver de acordo ao que a Polis ou cidade, indica6. “Todo Estado é, como sabemos, uma sociedade, tendo como seu principio a esperança de um bem, como sucede com qualquer associação, pois todas as ações dos homens têm por finalidade o que eles consideram ser um bem. Todas as sociedades têm, por tanto, como fim alguma vantagem e aquela sociedade que é a principal e encerra em si todas as outras propondo-se a maior vantagem possível. Chama-se Estado ou sociedade política7. Textos todos escritos sob a sua forma de filosofar, descrita em vários textos denominados Metafísica ou lógica da natureza8. Para o autor há causa ou principio das coisas, das atividades, do pensamento e  da interação social. Quer Montchrestien, quer Aristóteles, estão a defender domínios novos dentro dos quais o ser humano desenvolve a sua atividade.
 Aristóteles tenta argumentar com a sociedade do seu tempo de que a Cidade deve entrar em atividades comerciais que permitam não apenas a produção, bem como a reprodução dos seres humanos, da forma hierárquica que ele atribui no seu livro sobre Política: há o senhor e o escravo. O senhor é o déspota. Chamaremos despotismo o poder do patrão sobre o escravo; marital, o poder do marido sobre a mulher; paterno, o do pai sobre os filhos (dois poderes para os quais o grego não tem substantivos9 . Estas citações são-me importantes, para poder argumentar de que já há na humanidade, durante muito tempo, uma ideia de quem organiza e de quem aceita a organização. Na época de Aristóteles, essa organização é aceite de boa maneira por causa de existir formas de mudar de situação social, se as dívidas são pagas. Bem como pode-se convencer às pessoas com os pensamentos que alimentam às ideias que, com bens e recursos, as ditas pessoas podem raciocinar procurando a causa e o efeito dos seus actos e convencer, quer à Polis, quer ao lar, da sua mudança de ser ou de estar. Elementos que são explicitados na invocada Metafísica e retomados mais em frente como silogismos escolásticos por Tomás de Aquino no seu já muito invocado texto da Summa Theologica10 .
Mas, o que interessa neste texto, é reparar que Aristóteles e Montchrestien tentam induzir os seus governos a desenvolverem uma atividade nova para todos, especialmente na época que, desenvolvido o comércio e acumuladas as riquezas e feita a escolástica una filosofia dominante que procura, tal e qual a de Aristóteles, a propriedade da matéria física e das pessoas para dominar.
É o que está a acontecer na altura da manufatura. A indústria retira seres da vida rural e desenvolve um flagelo para os proprietários: a possibilidade das pessoas trabalhar em outros sítios e adquirir o que era prerrogativa de apenas poucos: a propriedade. Aparece Descartes em 1496 e as suas ideias que são de fora de Igreja Católica. Desenvolve um método luterano de pensamento dentro do que no seu tempo, denominava-se as Províncias Unidas – hoje Holanda, e escreve, entre outros textos, o seu Discours de la Méthode em 163711. Neste livro, publicado em Dinamarca e Suécia sob o cuidado da Rainha Cristina de Suécia, quem também resguarda e defende à pessoa do autor, Descartes que propões uma ideia, heresia no seu tempo porque defende que todos os homens nascem iguais e que têm a capacidade de pensar porque, apesar de forma biológica, existem diferenças de ser entre eles: O bom senso é a coisa que, no mundo, está mais bem distribuída, porque cada um pensa estar tão bem dotado dele, que até mesmo aqueles que dificilmente se contentam com qualquer coisa não costumam desejar mais do que aquele que possuem...o bom senso ou a razão, idêntica em todos os homens, é a faculdade que permite julgar, distinguir a falsidade do erro...12. Esta ideia de Descartes é altamente subversiva, por uma parte, enquanto, por outra, muito enganada, porque nem todos têm os meios iguais para razoar por não ter bens e agilidade igual, acabam por ficar em profundos erros como mais tarde ia-se comprovar na Revolução Francesa do Século XVIII. A igualdade foi sempre sonhada pelas pessoas todas, especialmente pela origem cristã bíblica das mesmas ideias. Igualdade que, quer Descartes, quer Hume em 173913, defendem a partir de ideias abstratas ou científicas ou em base a silogismos.


 Por outras palavras, autores que ajudam a se ser independente e autónomo do maior proprietário de bens que existia durante os Séculos nos quais coincidem Montchrestien, Descartes e Hume. Séculos que vem tremer a organização e estrutura económica e social existente até a aparição da Manufatura e a generalização do comércio, os bancos, a moeda, as letras, os pagares e outros símbolos de riqueza. A estrutura feudatária, ela própria fundadora das bases do comércio, acaba por ser enterrada, aos poucos, pela moeda que começa a percorrer e encher os bolsos dos novos proprietários. Os maiores proprietários feudatários da Igreja de Roma ou Católica. Começam a estar preocupados e reparam que não é com luta que vão ganhar a batalha pelo domínio da economia e de guardar a sua hierarquia social, hoje em dia disputada pelos comerciantes. A estrutura social está, no Século XVI, baseada na pose e produção da terra.
No entanto, um físico do Rei da França, François Quesnay, repara que não é com castigo, punições e anátemas que pode ganhar a guerra estabelecida entre a Industria e a Agricultura. A Industria ou Manufatura, é parte da riqueza dos comerciantes, que dominam o maior meio de circulação, a moeda. Pensa, de forma sabia, que é com argumentos que pode ir em frente. Junta-se à Enciclopédia e escreve um artigo em 175614. Defende o princípio de que o métayage ou arrendamento de terras é superior a ser caseiro, ou allouer, e propõe como política para o Reino de França de Louis XIV e Louis XV, ou sistema de métayage referido. Mas, repara que a Industria, que denominará mais tarde no seu texto Le Tableau Economique15, a riqueza estéril por não ser natural e não criar riqueza da própria natureza, atividade denominada indústria, capaz de gerar uma massa de riqueza monetária que nada tem a ver com a necessária riqueza pecuniária que dá a vida às pessoas e a nação. O que procura Quesnay é retirar do seu saber cartesiano e do seu saber médico, a demonstração da necessidade de sermos corpos que precisam de corpos para produzir, reproduzir e sobreviver e acumular riqueza, essa que parece ser criada apenas pela indústria, sítio para o qual fogem as pessoas da terra. No seu Ensaio da Encyclopédie, Les Moisson16, começa logo a reparar que ou se propõem orientações para o trabalho agrícola, ou não haverá mais produção rural atraente para os mercados dos produtos camponeses. Trabalhadores rurais que entendem como há investimento feito na manufatura e abandono do mesmo para as terras. A crítica de Quesnay é positiva: tenta e propõe definir por lei do Rei, as quantias de cereal para plantar cada ano, definir os melhores terrenos para essa plantação e a procura de mercados que, em tempos de expansão colonial, está a precisar de cereais para alimentar aos que vão embora as novas terras. O solo deve ser cultivado para o crescimento do rendimento nacional e não para o lazer dos proprietários que recebem rendas. Eis o motivo pelo qual procura a parceria e não o arrendar a meias ou caseiro: o foro passa a ser uma lei quase obrigatória para os proprietários rurais, que apenas se interessam em receber riquezas que não são reinvestidas de forma aritmética nas suas propriedades com a colaboração dos camponeses, que estão a espera de um justo trato, para poder enriquecer do campo e não da indústria, que acaba por cansar e não enriquecer (Quesnay, Les Moisson, passim) A má cultura exige, todavia, muito trabalho, mas, não podendo o cultivador [le métayer] fazer  as despesas necessárias, os seus trabalhos são infrutuosos: ele sucumbe e os burgueses imbecis atribuem estes maus sucessos à sua preguiça17Como antigo camponês ele próprio, defende um meio de subsistência por ele conhecido e que bem sabe que, com investimento feito, acabaria por haver indemnizações aos investimentos feitos: Os trabalhos da agricultura indemnizam despesas, pagam a mão-de-obra do cultivo, dão ganho aos agricultores e produzem ainda rendimentos dos bens de raiz. Os que compram os artefactos da indústria pagam as despesas, a mão-de-obra e o ganho dos mercadores: mas estes artefactos não produzem qualquer rendimento para além de isso18. Parece claro que a luta de Quesnay e os seus partidários, entre os quais o Primeiro-ministro do Rei e criador do Partido Político Physiocracie19, Jacques Necker, é uma luta pela riqueza das poses rurais, terras, trabalhadores, plantas ou fisiocracia, atividade da qual retira o nome para o seu partido. Não fui capaz de resistir acrescentar a cumprida nota prévia de rodapé sobre a ideologia, atividades e membros da Physiocratie, por causa de ser a época de luta entre duas formas de produção: rural e industrial, que causam duas formas de riqueza e, em consequência, duas classes sociais, que abrem o preâmbulo da Revolução Francesa e o liberalismo – socialismo para essa época –, que se expande pelo mundo, em guerra com as classes proprietárias. Para os fisiocratas, a indústria e comércio são estéreis ao não produzirem bens de forma natural ou da biologia, zoologia, fisiologia, mas sim e apenas do dinheiro, fator social muito cuidado por eles para entesourar e, eventualmente, tornar a investir em bens que mais tarde, Karl Marx denominaria Mais-valia.
No entanto, reparam que é preciso convencer à aristocracia francesa que é proprietária das terras e é para eles que escreve o dito Tableau Economique, já referido. Texto de apenas poucas páginas de contabilidade que ninguém se importa de responder. O começo de rolar de cabeças da aristocracia da França, começa pela ineptidão da classe mais tradicional do país. Mas, nem por isso os camponeses ficam com as terras, que passam a ser da propriedade da nova classe que manda, a burguesia.
Quesnay percebeu os seus erros20, que foram mais tarde reformulados por Adam Smith. O erro de Quesnay foi não reparar na “proclividade” ou “inclinação” ao trabalho que todas as pessoas pareciam ter, ou que era pensado pelos eruditos que tinham, e pensou que todos eram capazes de pensar e optar, da forma que o seu contemporâneo Descartes, tinha descrito, outro profundo erro. Além dos conceitos por ele organizados, há essa famosa frase que define a ideologia dos fisiocratas e que em português seria: Obter o maior aumento possível de bem-estar com o menos dispêndio possível. A riqueza vem da terra, produto natural, criado por Deus, e não da indústria, bem estéril por ser feito pela mão do homem21. E acrescenta que ganhar é diferente que produzir. Derradeira ideia que teve e que apenas Smith soube defender no seu texto A riqueza das Nações, que vamos ver a seguir.






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